

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 286 - 317, Janeiro/Abril 2017
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conceito de separação de poderes, como aconselha Lowenstein, deve ser tra-
tado como a divisão de funções estatais entre diversos órgãos do Estado, que
são considerados de maneira meramente figurativa como poderes. Nesse
aspecto, a separação de poderes consiste senão em uma forma de expressar a
necessidade de distribuir e controlar o exercício do poder político.
A teoria de Lowestein desmistifica a separação de poderes como dog-
ma, tornando-a pragmática e mais próxima da realidade e do dinamismo
do Estado contemporâneo. É possível falar, portanto, em uma divisão de
competências materiais – de funções ou de trabalho – entre órgãos, e não
em divisão de poderes, já que para a teoria do Estado o Poder é unitário,
indivisível e indelegável. Acrescente-se que a divisão figurativa de poderes se
dá, na realidade, quanto ao exercício do poder, impondo a execução racional
e especializada das formas básicas de atividade estatal entre órgãos diversos
com competências próprias. Quando se fala em princípio da separação de
poderes, deve-se compreender a referência essencialmente como a divisão de
funções do Estado entre diversos órgãos estatais.
Embora reconheça a conexão entre os conceitos, Afonso da Silva faz a
distinção entre divisão de funções e separação de poderes ao afirmar,
in verbis
:
“A distinção de funções constitui especialização de tarefas go-
vernamentais à vista de sua natureza, sem considerar os órgãos
que as exercem; quer dizer que existe sempre distinção de fun-
ções, quer haja órgãos especializados para cumprir cada uma
delas, quer estejam concentradas num órgão apenas. A divisão
de Poderes consiste em confiar cada uma das funções gover-
namentais (legislativa, executiva e jurisdicional) a órgãos dife-
rentes, que tomam os nomes das respectivas funções (menos o
Judiciário): órgão ou Poder Legislativo, órgão ou Poder Execu-
tivo e órgão ou Poder Judiciário. Se as funções forem exercidas
por um órgão apenas, tem-se concentração de poderes.”
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Ainda sobre a separação de poderes como divisão de funções, Aragão
sustenta que,
“Se retirarmos o caráter dogmático e sacramental impingido ao
princípio da separação dos poderes, ele poderá, sem perder a vi-
talidade, ser colocado em seus devidos termos, que o configuram
32 AFONSO, José da Silva. Harmonia entre os Poderes e Governabilidade.
Revista de Direito do Estado (RDE)
, n.º
1: 25-35, jan/mar 2006, p. 27.