

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 286 - 317, Janeiro/Abril 2017
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ção tripartida de funções militaria contra a faceta funcional do próprio
princípio da separação de poderes.
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Sendo assim, torna-se imprescindível sustentar uma leitura renovada
do princípio da separação dos poderes, franqueada a arranjos institucionais
menos ortodoxos e dotados de maior plasticidade, desde que preservados
os valores essenciais do princípio, que, atualmente, transcendem à preocu-
pação de conter o exercício do poder político em nome da liberdade. Hoje,
ao se falar na cláusula pétrea da separação de poderes, deve-se evitar uma
concepção excessivamente rígida da cláusula, que impossibilite a adaptação
institucional dos organismos do Estado às novas exigências das sociedades
contemporâneas.
3.3.3. Separação de poderes como ideia de controle, fiscalização e
coordenação recíprocos
Com a perda de vigor da especialização funcional taxativamente
vinculada ao esquema da tripartição, a interpretação contemporânea cons-
titucional da separação de poderes vem reconduzindo a compreensão do
princípio, em toda a sua dinâmica, para a vertente relativa ao controle recí-
proco, que é associada à doutrina norte-americana dos
checks and balances
(sistema de freios e contrapesos). Enquanto a tipificação originária das fun-
ções estatais e a respectiva distribuição entre os órgãos do poder se afastam
gradativamente do conteúdo nuclear da cláusula da separação de poderes,
por outro lado, em sua versão contemporânea, os controles recíprocos se
aproximam deste.
Para Piçarra, no Estado de direito contemporâneo, o centro de gra-
vidade do princípio da separação de poderes é constituído pelas noções
de controle, fiscalização e coordenação recíprocos. O autor afirma que “o
sistema de controlos jurídicos constituiria o núcleo essencial do princípio
da separação dos poderes no Estado de Direito contemporâneo”, no qual se
incluem as tarefas de fiscalização e coordenação.
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Logo, a leitura contemporânea do princípio jurídico da separação de
poderes destaca o controle, a fiscalização e a colaboração entre os órgãos que
desempenham as atividades estatais, sendo tais atribuições partes integrantes
e indissociáveis do núcleo essencial do princípio, que opera como regra jurí-
42 DABIN, Jean.
Doctrine Générale de L’État, Bruylant e Sirey, Bruxelas e Paris
, 1939, p. 284-285. Apud ARAGÃO,
Alexandre Santos de.
Agências Reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico.
Rio de Janeiro:
Forense, 2002, p. 378.
43 PIÇARRA, N. Obra citada, p. 258-259.