

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 286 - 317, Janeiro/Abril 2017
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não precisa mais ser combatida contra um monarca absolutista que dei-
xou de existir.”
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Como leciona Bonavides, “os valores políticos cardeais
que inspiraram semelhante técnica ou desapareceram ou estão em vias de
desaparecimento.”
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Por outro lado, hoje adquire relevância a preocupação do Estado e da
sociedade com o controle e fiscalização do exercício das funções estatais em
vista de melhores resultados no trato da coisa pública, o que mitiga a preo-
cupação com o órgão competente para desempenhá-las. Como observa Souza
Neto, na quadra atual está em jogo a contenção do arbítrio e o modo pelo qual
as funções públicas são exercidas – que seria o núcleo material do princípio
–, “não a garantia de competências exclusivas para cada órgão do estado.”
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No caso brasileiro, a autonomia constitucional dos Tribunais de
Contas e a criação do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Na-
cional do Ministério Público podem ser considerados casos emblemáticos
de valorização do controle e da fiscalização na atuação dos órgãos estatais,
sobretudo para garantia de atendimento aos princípios constitucionais da
Administração pública (legalidade, impessoalidade, moralidade, publici-
dade e eficiência).
A principal finalidade do Estado contemporâneo é promover os direi-
tos fundamentais da sociedade. Sendo assim, a par da contenção dos abusos,
a estabilidade entre os órgãos que desempenham as atividades estatais, de
maneira a prevenir desequilíbrios institucionais, é o novo mote da separação
de poderes, isto é, a condição essencial para que o Estado possa atingir seus
objetivos primordiais, que são promover a justiça, a segurança e o bem-estar
da coletividade. A busca pelo sentido e alcance de uma separação de poderes
renovada, convertida em técnica jurídico-instrumental, não pode prescindir
de todas essas circunstâncias relevantes.
3. 3. O conteúdo jurídico da nova separação de poderes
3.3.1. Divisão racional de atribuições e teste de legitimidade
Assentadas as premissas sobre a desejável mudança de compreensão
do princípio, importa deixar claro que, do ponto de vista ontológico, o
29 CYRINO, A. R. Obra citada, p. 37.
30 BONAVIDES, P. Obra citada, p. 157.
31 SOUZA NETO, Cláudio Pereira de.
Teoria constitucional e democracia deliberativa.
Rio de Janeiro: Renovar,
2006, p. 31.