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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 286 - 317, Janeiro/Abril 2017

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3. DO CONCEITO CLÁSSICO À NOÇÃO CONTEMPORÂNEA

3.1. A insuficiência da acepção clássica da separação de poderes

O esquema tradicional do princípio da separação de poderes, se-

gundo os padrões dogmáticos consagrados pela doutrina de Montesquieu,

considera os poderes do Estado divididos em três: o Legislativo, o Execu-

tivo e o Judiciário. A cada Poder do Estado é conferida uma função. À

função de legislar, atribuída ao Legislativo, cabe criar direitos e obrigações

por meio da edição de normas gerais e abstratas; ao Executivo é conferi-

da a função administrativa, que atualmente desdobra-se na prestação de

serviços públicos, no exercício das atividades de polícia e de fomento e

na intervenção nos ordenamentos econômico e social; por fim, à função

jurisdicional, desempenhada pelo Judiciário, compete interpretar e aplicar

os direitos e obrigações criados pela lei aos casos concretos, dirimindo

conflitos de interesse.

Todavia, o próprio arranjo institucional do Estado moderno per-

mite que os centros de poder estatais desempenhem funções consideradas

atípicas, para as quais não há exclusividade, como reforço de sua indepen-

dência em face dos demais poderes. As situações de exercício não exclusivo

de funções estatais mais citadas na experiência brasileira são as seguintes:

i) em caso de

impeachment

, por intermédio da Câmara e do Senado Fe-

deral, o Legislativo exerce a função de processar e julgar o Presidente da

República em crimes de responsabilidade (art. 52, I, CRFB); ii) o Judiciário

desempenha funções administrativas (art. 96, I, CRFB); e, iii) o Executivo

legisla por meio de Medida Provisória (art. 62, CRFB).

Além da divisão de funções estatais entre órgãos constitucionalmen-

te instituídos, integra o conteúdo clássico da separação de poderes o de-

nominado sistema de freios e contrapesos –

checks and balances

–, que é

a técnica pela qual os poderes promovem, reciprocamente, o controle dos

atos praticados. Os

checks and balances

constituem formas de equilíbrio e

interferência entre os poderes como instrumento de garantia da liberdade.

Significam o controle do exercício do Poder pelo próprio Poder, cujos

limites são definidos pela Constituição. Uma vez excedidos estes limites, o

poder que detém a competência para controle pode conter o outro poder

transgressor. Em linhas gerais, os objetivos do sistema de freios e contrape-

sos são os seguintes: i) evitar o despotismo; ii) limitar a autoridade; e, iii)

garantir as liberdades individuais.