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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 272 - 285, Janeiro/Abril 2017

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injustos, pressuposto assentado há três séculos. De fato, em uma perspecti-

va puramente reparatória, impossível defender uma responsabilidade sem

dano, porque a responsabilidade civil se resumiria a reparar e nada mais

4

.

2 FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS PARA A RESPONSABILI-

DADE CIVIL SEM DANO-PREJUÍZO

A possibilidade de assentar a responsabilidade civil em um pilar diver-

so do unicamente reparatório se solidifica dentro de uma revisão mais am-

pla de categorias do direito privado à luz da Constituição, tornando possível

à responsabilidade civil desempenhar funções diversas da reparatória, como

reflexo das novas exigências advindas da falência do modelo jurídico liberal.

O primeiro pressuposto liberal que entrou em crise foi a ideia de

que as pessoas eram “livre e iguais”. A liberdade foi pré-requisito para a

formação do Estado como consequência da vontade livre de todos, ideia

liberal esta que se transfere para outras esferas, como no contrato, no qual há

força obrigatória de tudo o que é pactuado justamente porque as partes são

“livres” para contratar. Contudo, esse dogma não era condizente com a pro-

funda desigualdade e relações de poder no bojo das relações Estado-cidadão,

fornecedores-consumidores e empregadores-empregados.

A igualdade foi proclamada como uma exigência apenas no plano

formal, o que é demasiadamente importante para rechaçar privilégios de

grupos ou pessoas, assegurando um tratamento isonômico perante a lei e o

direito. Contudo, do mesmo modo como o fator liberdade entrou em co-

lapso, a igualdade também ganhou outro sentido, a partir das exigências de

uma sociedade com justiça distributiva e social, apta a promover e efetivar

a igualdade substancial.

O Código Napoleônico de 1807 trouxe consigo uma série de carac-

terísticas que representavam bem o ideal burguês. O código foi inspirado

no projeto iluminista de expandir os mercados, firmar a liberdade e anular

os monopólios, e, pra isso, sacramentou a proteção da livre contratação e

autonomia das partes. Outra característica importante foi o espírito de que

a lei poderia ser completa e perfeita na tarefa de regular a vida em sociedade,

de modo que as leis escritas, em razão da segurança jurídica respectiva, po-

deriam compreender todas as regras em vigor

5

.

4 FARIAS, Cristiano Chaves de; BRAGA NETTO, Felipe Peixoto; ROSENVALD, Nelson.

Novo Tratado de respon-

sabilidade civil

. São Paulo: Atlas, 2015, p.57.

5 TEDESCHI, Sebastián Ernesto.

El Waterloo del

Código Civil Napoleónico: una mirada crítica a

los fundamentos

del Derecho Privado Moderno para la construcción de sus nuevos princípios generales

. In: COURTIS, Chris-

tian.

Desde outra mirada.

Buenos Aires: Universidad de Buenos Aires, 2011, p. 163.