

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 272 - 285, Janeiro/Abril 2017
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Nesse mesmo sentido, recente dissertação de mestrado apresentada
por Silvano José Gomes Flumignan à Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo – USP buscou investigar a discussão sob outra perspectiva,
contribuindo sobremaneira ao diferenciar o dano-evento do dano-prejuízo,
defendendo que uma visão completa do dano só é viável a partir da compre-
ensão dessas duas dimensões do dano.
O dano, sob uma perspectiva, é a lesão ao direito subjetivo ou ao in-
teresse juridicamente protegido (dano-evento); por outra perspectiva, o dano
será a consequência da lesão (dano-prejuízo). A conclusão a que chega o
autor é a de que a consolidação jurídica do dano necessita da constatação
de ambas as esferas do dano: “para a caracterização (...) do dever de ressarcir,
ambos precisam estar presentes. Quanto a este ponto não há exceção”
2
.
Desse modo, a referida tese mantém a interpretação majoritária e clás-
sica capitaneada por Sérgio Cavalieri Filho, no sentido de que a responsa-
bilidade civil tem como principal função a reparatória, e, por óbvio, sem
o respectivo dano-prejuízo, nenhuma importância terá a violação abstrata
de interesses juridicamente protegidos, porque “o dano-consequência será o
objeto da pretensão ressarcitória. Sem a consequência danosa, pode haver até
a responsabilidade penal, a civil jamais”
3
.
Contudo, apesar da coerência dessa corrente com os pressupostos por
ela traçados, ousa-se discordar. O desconcerto a ser abordado no presente
artigo é possível por meio de um novo olhar para a responsabilidade civil,
com novos pressupostos assentados no matiz constitucional inaugurado a
partir da Constituição Federal de 1988, quando será possível defender a su-
ficiência do dano-evento para configurar a responsabilidade civil.
Portanto, será possível falar em responsabilidade civil sem dano-pre-
juízo, caso se conceba a responsabilidade civil em sentido amplo e com o
objetivo de desestimular condutas censuráveis e violadoras de direito (dano-
-evento). Nesse viés, ao indagar sobre a possibilidade de responsabilidade
civil sem dano, Cristiano Chaves de Farias, Felipe Peixoto Braga Netto e
Nelson Rosenvald afirmam que a resposta será negativa se o pressuposto
for em termos de responsabilidade civil clássica no sentido de reparar danos
morona por falta de conservação pelo proprietário, mas não atinge nenhuma pessoa ou outros bens, não haverá o que
indenizar. (...) O ato ilícito nunca será aquilo que os penalistas chamam de crime de mera conduta; será sempre um
delito material, com resultado de dano. Sem dano pode haver responsabilidade penal, mas não há responsabilidade civil.
(CAVALIERI FILHO, Sérgio.
Programa de responsabilidade civil
. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 76-77).
2 FLUMIGNAN, Silvano José Gomes.
Dano-evento e dano-prejuízo
. Dissertação de mestrado. São Paulo: USP, 2009.
3 FLUGMINAN, Silvano José Gomes.
Dano-evento e dano-prejuízo
, p. 124.