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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 78, p. 168 - 187, Janeiro/Abril 2017
GUSTAVO ZAGREBELSKY expõe esse fenômeno explicando que as
“sociedades pluralistas atuais, ou seja, as sociedades marcadas pela presen-
ça de uma variedade de grupos sociais portadores de interesses, ideologias
e projetos diferenciados, mas na qual nenhum tem força suficiente para
reivindicar exclusividade ou preponderância, nem, por consequência, para
fornecer a base material da soberania estatal no sentido do passado, o que
também quer dizer, as sociedades dotadas, no seu conjunto, de um certo
grau de relativismo, atribuem à Constituição a função de realizar as con-
dições que tornem possível a vida em comum, mas não aquela de realizar
diretamente um projeto pré determinado de vida comum. Sobre a base de
uma Constituição, plataforma de partida que oferece uma garantia de legi-
timidade a todos os grupos da sociedade, podem se engajar para competir
para moldar concretamente o Estado em uma direção ou outra [maior
ou menor estatização, acresceríamos], dentro do quadro de possibilidades
ofertadas pelo compromisso constitucional”.
19
Apesar das imperfeições inerentes a toda classificação,
20
podemos
dividir a atuação do Estado em relação à economia em
atuação indireta
,
geralmente coincidente com a atuação regulatória, pela qual o Estado fixa
externamente normas para pautar o comportamento dos agentes econô-
micos privados; e
atuação direta
, na qual, por diversas razões (sociais,
estratégicas, desenvolvimentistas etc.),
21
o Estado exerce – ele próprio – de-
terminada atividade econômica.
No primeiro caso o Estado atua
sobre
a economia: ele não realiza
operações econômicas, mas apenas tenta influenciar atividades econômi-
cas exercidas por terceiros, seja mediante a emissão de normas jurídicas
coercitivas (contratos de delegação de atividades públicas ou poder de po-
lícia), seja por normas incentivadoras (de fomento).
22
Prevista no art. 174,
19 ZAGREBELSKY, Gustavo.
Le Droit en Douceur
–
Il Diritto Mite. Trad. Michel Leroy. Paris: Ed. Econômica, 2000. p. 11.
20 Sousa Franco e Guilherme Martins afirmam que a classificação entre atuação direta e indireta do Estado na economia
“pode ser útil, no domínio dos conceitos institucionais de política econômica; mas não tem interesse jurídico e, pela mul-
tiplicidade de critérios que se entrecruzam, torna-se confusa”, SOUSA FRANCO, António L.; MARTINS, Guilherme
D’Oliveira.
A Constituição Económica Portuguesa:
ensaio interpretativo. Coimbra: Almedina, 1993. p. 223.
21 A atuação direta do Estado na economia é justificada para o desenvolvimento de políticas sociais, de educação, de
ciência e tecnologia, da infraestrutura e concessão de crédito a setores produtivos, muitas vezes sendo a única forma, nos
países de industrialização tardia, de viabilizar o desenvolvimento. “Todos os países que conseguiram transpor a barreira do
subdesenvolvimento e ingressaram no seleto clube dos países desenvolvidos, não o fizeram sem políticas especificamente
voltadas para esse fim, formuladas e executadas por governos comprometidos (...), como chama a atenção um relatório
internacional patrocinado pelo Banco Mundial e os governos da Austrália, Holanda, Suécia e Reino Unido.” SILVA, Josué
Gomes da. Para uma Estratégia de Desenvolvimento. In: SICSÚ, João; CASTELAR, Armando (orgs.)
Sociedade e Eco-
nomia:
estratégias de crescimento e desenvolvimento. Brasília: IPEA, 2009. p. 47.
22 MONCADA, Luis Solano Cabral de.
Direito Económico
. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1998. p. 184.