

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 77, p. 188 - 210, Janeiro 2017
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sa, e até mesmo de inequívoca condenação
2
, tal situação, em casos
extremos, afigura-se preferível ante a inadmissível possibilidade de
haver julgamento (pelo mesmo Juiz e por motivação semelhante)
tendencioso, de alguma forma, em favor de uma das partes
3
, em par-
ticular daquela que se mostre com maior prestígio social ou poderio
político-econômico.
“O interesse, direto ou indireto, do Juiz, no tocante ao
caso que lhe é oferecido para julgamento, fá-lo Juiz ilegí-
timo e acarreta a invalidade de quanto decidir. Processo
sem Juiz imparcial não é processo jurisdicional e, nesses
termos, não é devido processo legal e sim processo no
qual foi violada a garantia do
due process.
” (PASSOS, 1982)
É importante consignar que, muitas vezes, durante a vigência
do Código de Processo Civil de 1939, o Magistrado despreparado
para julgar determinada demanda – sob o prisma da ausência da
2 Não é por outra razão que o processo de seleção do magistrado deve ser constantemente aperfeiçoado e perseguido em
sua própria plenitude. O julgador deve – além da efetiva comprovação de conhecimentos técnico-jurídicos – demonstrar
durante o processo de recrutamento a necessária aptidão para o exercício da função, o que corresponde, em outras pala-
vras, à presença de certas qualidades, tais como a
moralidade
, a
ética
, a
firmeza de caráter
, a
consciência reta
(não perplexa, a hesitar
ante as dificuldades dos textos e a contradição entre as alegações e as provas), a
serenidade
, o
domínio absoluto sobre as paixões
,
a
coragem moral
e a
permanente disposição de enfrentamento
diante das contínuas pressões políticas.
Não podemos nos esquecer de que, em grande medida, a observância de um rigoroso processo de seleção e recrutamento
de juízes, - quando efetivamente existente -, tem se mostrado, ao longo do tempo, sinérgico mecanismo apto a coibir,
de forma preventiva, a indesejável presença, no Poder Judiciário, de magistrados com desvios de caráter suficientemente
acentuado para o comprometimento, ainda que parcial, da prestação jurisdicional.
3 Apesar de ambas as situações – a do magistrado que se acovarda diante das pressões que envolvem o julgamento de
uma demanda determinada e que, por conta disso, utiliza-se (levianamente) do expediente da declaração de suspeição por
motivo íntimo, e a do Juiz que simplesmente julga parcialmente (com ausência de isenção e independência) a demanda em
favor daquela parte que se apresenta como “pessoa poderosa do meio”, em face de seu incontestável prestígio e capacida-
de político-econômica – se constituírem em motivos igualmente ensejadores de veemente repulsa, sem a menor sombra
de dúvida, numa situação de inexorável opção, deve ser preferível a primeira situação (caracterizadora do Juiz covarde) à
segunda (evidenciadora da prestação jurisdicional completamente exposta à plena ausência de sua própria legitimidade),
até porque, a absoluta
isenção
,
imparcialidade
e
independência
do Juiz (e do julgamento conduzido pelo mesmo) constituem-se
em condição
sine qua non
para o efetivo exercício da função judicante.
Ademais, é importante ressaltar que o comportamento particular – fraco, covarde e pusilânime – do magistrado (con-
denável em todas as circunstâncias) pode, no máximo, comprometer o julgamento quanto ao caráter de sua própria
pessoa, por parte dos jurisdicionados, ao passo que, com toda a certeza, o julgamento tendencioso, conduzido ao sabor
da parcialidade (sobretudo em favor da parte visivelmente mais forte) e da ausência de isenção e independência por parte
do julgador pode comprometer seriamente toda a estrutura do Poder Judiciário, sua própria legitimação e, acima de tudo,
sua indispensável credibilidade social.
Já prelecionava, a respeito, MORTARA que “se os resultados da função jurisdicional não fossem assegurados pela abso-
luta honestidade, imparcialidade e diligência dos juízes, inútil seria pôr o mais profundo estudo e a mais meditada cautela
a serviço de construir, com os mais sólidos materiais e segundo as melhores regras de arquitetura, o edifício da hierarquia
judiciária”.