

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 77, p. 9 - 24, Janeiro 2017
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tem pouca disposição e vigor para agir, seja porque individualmente
considerados os referidos danos são baixos.
Nesse desiderato, o lucro ilícito a partir de uma apatia coletiva
de pequenos danos gera outro fenômeno: o da litigação repetitiva
(
repeat players
), o qual é reforçado pelo enorme grau de desinteresse
pelo outro, próprio da modernidade, individualismo liberal a coexis-
tência pacífica de setores da vida humana incomunicáveis entre si,
mas considerados harmônicos (a vida individual e a vida comuni-
tária): “so work is divided from leisure, private life from public, the
corporate from the personal. (...) And all these separations have been
achieved so that it is the distinctiveness of each and not the unity of
the life of the individual" (MACINTYRE,
Op. Cit
., p. 204).
Por fim, um magistrado insensível ao mundo que o rodeia e
aos seus fenômenos desagregadores não julgará atendendo aos di-
tames constitucionais do solidarismo, que, como princípio que é,
impõe interpretações jurídicas em um determinado vetor, podendo
influenciar na interpretação de categorias do direito privado, espe-
cialmente diante de casos que denotem a apatia racional e a litigação
repetitiva, elementos que evidenciam essa fragmentação e o desinte-
resse pela esfera de bens jurídicos de outrem.
3. A FASE PRÉ-INTERPRETATIVA E INTERPRETATIVA DO DI-
REITO COMO INTEGRIDADE: A IMPORTÂNCIA DO RECORTE
NORMATIVO JUSTIFICADO
A concepção de direito de Ronald Dworkin exige que o intér-
prete tenha responsabilidade com as reivindicações da integridade;
uma delas é a de que o destino dado ao direito seja o que melhor se
amolde às práticas da comunidade e isso implica potencializar a efe-
tividade de princípios jurídicos, os quais são responsáveis por dotar
de sentido, unidade e coerência os sistemas jurídicos, especialmente
os de cunho constitucional, como o da solidariedade. Nesse sentido,
Lenio Luiz Streck acentua essa dimensão da integridade:
(...) de modo a expressar um sistema único e coerente de justiça
e eqüidade na correta proporção, diante do que, por vezes, a
coerência com as decisões anteriores será sacrificada em nome
de tais princípios (circunstância que assume especial relevância