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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 77, p. 101 - 129, Janeiro 2017

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midade das opções da sociedade, na medida em que harmonizadas

com a ordem jurídica constitucional e os direitos fundamentais que

prescreve.

Em outras palavras, os planos de ação governamental não são

concebidos, como outrora, para atender aos desígnios das autorida-

des estatais. Estas devem colher os reclamos legítimos da sociedade

e atendê-los. Daí a visceral importância de elos permanentes e hábeis

de comunicação entre a sociedade e o estado, de sorte que este ab-

sorva os comandos daquela e os implemente no que consensuais. O

estado democrático de direito é o garante da efetivação dos direitos

consagrados na Constituição, sejam os individuais, os econômicos,

os políticos ou os sociais. Ser-lhe fiel é o dever jurídico indeclinável

do estado.

Essa fidelidade há de estar presente em todos os níveis do pla-

nejamento. Cada plano de ação governamental deve ser uma respos-

ta à efetivação dos direitos fundamentais e do respeito à dignidade

humana que os inspira. Se assim não for, não haverá estado demo-

crático de direito, nem a administração responsiva e de resultados

que lhe deve corresponder.

Nada obstante, há uma condição cultural, em seu sentido so-

ciológico, para que assim ocorra: a sociedade brasileira há de eman-

cipar-se da polarizada relação entre tutores e tutelados, que carac-

teriza a cultura nacional desde o seu berço colonial. Entendendo-se

por tutor todo aquele que ocupe posição de prestígio e poder na

hierarquia social - seja qual for a natureza dessa hierarquia – e por

tutelado todo aquele que se sirva do tutor para obter vantagem ou

proteção de qualquer sorte.

Não seria necessária maior digressão para perceber-se como

essa relação compromete a emancipação da sociedade brasileira; basta

lembrar os critérios segundo os quais grande número de candidatos

se elege, por prometer vantagens e ganhos pessoais a seus eleitores

(material de construção, empréstimos, empregos, cargos, apadrinha-

mentos, atendimentos pelos serviços públicos etc.). O socialmente pa-

tológico dessa relação está em que o tutor compraz-se em ser tutor e o

tutelado anseia por encontrar o seu tutor e permanecer como tutelado.

Em outras palavras: não há espaço para o mérito nessa relação, só

para o interesse egoístico. Logo, tampouco há real preocupação em