

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 20, n. 77, p. 101 - 129, Janeiro 2017
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fundamentação que se decompõe em valores jurídicos identifi-
cáveis, de modo algum a enunciados puramente retóricos.
No mundo anglo-saxão se tem percebido que é justamente o
desenvolvimento das técnicas de controle jurídico da discri-
cionariedade (não unicamente da discricionariedade adminis-
trativa, também e talvez especialmente a do legislador em face
da justiça constitucional) aquela que tem levado ao desenvol-
vimento uma concepção mais extensa e aberta do direito, com-
preendendo princípios tanto como normas, citando-se nesse
sentido o importante exemplo de Ronald Dworkin e de Nonet
e Selznick. Esse desenvolvimento implica uma completa revi-
são da ideologia e da metodologia jurídica. Assim tem ocorri-
do também em França, com o Conselho de Estado, muito me-
nos legalista ou positivista do que a do Tribunal de Cassação, e
de fato, em alguma medida, tem transmitido a este uma visão
aberta do direito.
Em definitivo, o controle judicial da discricionariedade, em
particular o controle que abre – e obriga – o princípio consti-
tucional da interdição da arbitrariedade, não significa abrir a
possibilidade de uma livre estimação pelos juízes, alternativa às
estimações discricionárias que à Administração incumbe com
apoio legítimo na lei, nem pressupõe que se ignore a função
política que, nos limites do conjunto constitucional de po-
deres, corresponde a esta. O controle judicial da discriciona-
riedade deve efetivar a norma, não menos constitucional, da
vinculação da Administração à lei e ao direito - conceito que
por si só remete aos princípios gerais -, assim como o controle
fundado na interdição da arbitrariedade dos poderes públicos.
Somente como princípios gerais de direito, em sentido rigo-
rosamente técnico, é que podem atuar e ser impostos pelos
tribunais de justiça. Não suplanta, portanto, esse controle a
função própria dos órgãos políticos e administrativos; cabe ao
controle judicial fazer com esses órgãos atuem e se movam den-
tro do espaço preciso em que a Constituição os situa, que é o
espaço delimitado pela lei e pelo direito como essência mesmo
do estado de direito.