

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 56 - 85, jul. - set. 2016
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dos. Nessas situações, os membros da sociedade não poderão invocar,
perante os credores sociais, a sua propriedade sobre objetos que eles pró-
prios classificam alternadamente como seus ou da sociedade
28
. O jurista
argentino Daniel E. Moeremans, ao indicar a confusão patrimonial como
um dos casos de aplicação da teoria da desconsideração, pondera: “
Los
miembros de una persona jurídica sólo pueden alegar la limitación de res-
ponsabilidad que tiene su base en el principio de división de patrimonios,
cuando los mismos respectan dicha división
”
29
.
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica tem sido
aplicada também quando ocorre a chamada condução externa, ou seja,
situações em que a empresa é controlada por outra. Fábio Konder Com-
parato aponta a confusão patrimonial entre controlador e sociedade con-
trolada como critério fundamental para aplicação da teoria da descon-
sideração da personalidade jurídica que ele chama de
externa corporis,
explicando que, sendo a pessoa jurídica nada mais do que uma técnica
de separação patrimonial, se o controlador, que é o maior interessado na
manutenção desse princípio, descumpre-o na prática, não se vê bem por
que os juízes teriam de respeitá-lo, transformando-o numa regra pura-
mente unilateral
30
.
28 Luiz Roldão de Freitas Gomes, ao tratar das hipóteses em que o princípio da limitação de responsabilidade dos
sócios deve ser mitigado, contempla argumentos referentes à desconsideração da personalidade jurídica em casos
de confusão patrimonial, mencionando que na “determinação de casos não se há, necessariamente, de inferir que
não inocorra em responsabilidade em situações outras, posto que não expressamente contempladas na lei, máxime
quando venha a auferir proveito dos atos praticados pela sociedade, cuja atuação é moldada a este fim, guiada pela
sua vontade,
usando-a para a consecução de objetivos individuais, com ela se identificando, de tal a ser por ele nomi-
nada, confundindo-se os patrimônios, promíscuos os negócios sociais e dele, o sóci
o. Em situações tais, se se revela
insuficiente o patrimônio da sociedade a responder por obrigações contraídas no evidente interesse do sócio que a
controla e dirige soberanamente, de tal sorte que, inadimplidas, impliquem injusto e intolerado prejuízo a credores,
que levaram em conta, de boa-fé, ao vincularem-se, a pessoa e bens do sócio que surgia como o senhor, beneficiário
e garante do negócio, hão aqueles de poder dirigir-se contra os bens do sócio,
ut singuli
, independente da forma
societária e, nas sociedades de quotas de responsabilidade limitada, a despeito da integralização da respectiva par-
ticipação social” - grifamos (“Desconsideração da personalidade jurídica”.
O direito.
1990. v. 1, p. 8).
29
"Extensión de la responsabilidad de los socios en las sociedades de capital en virtud del ‘Disregard of the Legal
Entity".
Revista del Derecho Comercial y de las Obrigaciones
, v. 22, n. 131, out/1989, p. 720. O autor refere que
“cuando el patrimonio de los socios no puede ser distinguido del patrimonio de la sociedad, se habla de una confusi-
ón de patrimonios (Vermögensvermengung). Cuando, en cambio, la división de la persona juridica y de sus miembros
no se puede distinguir exteriormente, se habla de confusión de esfera (Sphärenvermischung). Este último caso se
presenta cuando, por ej., el nombre, la organización (libros, cuenta bancária y bienes patrimoniales), la imputación
patrimonial o las formalidades societarias no son cumpridas, y, por lo tanto, no se puede reconocer si se está en
presencia de un acto societario o de los socios. En tal caso, no pueden alegar los socios que ellos son proprietarios de
los bienes que aparecen como sociales, o afirmar este caráter cuando aparecen como bienes privados”
. Entendemos
despicienda esta diferenciação apresentada pelo autor, pois, em ambas as situações identificadas - confusão de pa-
trimônios e confusão de esferas -, poderá haver a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica
do ente societário e não poderão os sócios valer-se da oposição do dogma da separação patrimonial entre os bens
da pessoa jurídica e os de seus membros.
30
O poder de controle na sociedade anônima
, 6ª ed., atualizada por Calixto Salomão Filho, Rio de Janeiro: Forense,
2014, p. 450. Este autor informa que outro critério utilizado na Europa e nos Estados Unidos, para desconsiderar a