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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 56 - 85, jul. - set. 2016

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4.1. A cláusula geral da teoria da desconsideração na codificação civil

O art. 50 do Código Civil oferece previsão normativa que representa

a cláusula geral sobre o tema da teoria da desconsideração da personali-

dade jurídica em nosso sistema jurídico, o que representou, na época de

sua inserção em nosso ordenamento positivo, a aurora de novo estágio

de seu itinerário.

O texto mantém-se apegado à utilização excepcional da teoria,

submetendo-a ao prudente critério do Judiciário. O fenômeno da descon-

sideração é inserido no plano da eficácia, seguindo o entendimento da

melhor doutrina sobre a questão, e há extensão da responsabilidade não

somente aos sócios, mas também aos administradores da sociedade.

A codificação civil, ao fixar as balizas de orientação para a aplicação

da teoria da desconsideração da personalidade jurídica no direito privado,

como sanção adequada para punir os casos de abuso da pessoa jurídica,

se valeu da técnica da cláusula geral, vinculando-a à presença de funda-

mentos expressos em conceitos jurídicos indeterminados, que são o

des-

vio de finalidade

e a

confusão patrimonial

. Nesse compasso, passamos,

então, à análise dessas hipóteses.

4.1.1. O desvio de finalidade

O codificador civilista, ao se referir ao

desvio de finalidade

como

motivo ensejador do reconhecimento da utilização abusiva da pessoa ju-

rídica, deixou consignada a sua preocupação no sentido de que a pessoa

jurídica se mantenha vinculada ao escopo que levou o ordenamento jurí-

dico a lhe atribuir personalidade jurídica. Suzy Elizabeth Cavalcante Koury,

nessa linha, aponta a existência de discricionariedade do juiz na aplicação

da

disregard doctrine

, explicando que isso

“implica o dever de adotar a

melhor solução para que se alcance a finalidade da lei, sendo certo que a

pessoa jurídica, como ente distinto dos sócios que a compõem, evidente-

mente não foi criada com o intuito de permitir que fraudes e simulações

alcancem seus objetivos, nem, tampouco, para que se atinjam fins contrá-

rios aos princípios que norteiam o ordenamento jurídico”

21

.

21

Op. cit.

, p. 134. A autora complementa, explicando:

“por todas estas razões, cabe ao julgador, no exame do caso

concreto, indagar, perquirir as atividades empresariais, bem como a forma e a atuação das empresas, a fim de que,

ainda na fase de conhecimento, possa investigar a utilização da pessoa jurídica com finalidades contrárias àquelas

para as quais foi criada pelo ordenamento”.