

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 56 - 85, jul. - set. 2016
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A
disregard doctrine
também foi positivada no regramento sobre a
responsabilidade ambiental (Lei nº 9.605/95), que, em seu art. 4º, prevê:
“Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personali-
dade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do
meio ambiente”.
Finalmente, a Codificação Civil de 2002 trouxe a cláusula
geral da teoria da desconsideração para o direito privado nacional, em
seu artigo 50 (
“Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado
pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz deci-
dir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber
intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de
obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores
ou sócios da pessoa jurídica”
)
19
. Mais recentemente, a legislação anticor-
rupção (Lei nº 12.846/2013) normatizou a desconsideração na seara ad-
ministrativa, ou seja, independentemente de decisão judicial, prevendo
em seu artigo 14 que
“A personalidade jurídica poderá ser desconsidera-
da sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou
dissimular a prática de atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar
confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções apli-
cadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de
administração, observados o contraditório e a ampla defesa”
.
Em todas essas disposições, que positivaram a
disregard of the legal
entity
, sempre foi preservada a noção de que tal disciplina não visa atingir a
extinção da pessoa jurídica, representando, portanto, hipótese de ineficácia
episódica do fenômeno da personificação, afastando, tão somente para o
caso concreto, as consequências da separação patrimonial, estendendo a
responsabilidade por determinados atos aos sócios ou administradores da
pessoa jurídica, atingindo, assim, o patrimônio pessoal destes
20
.
petição. Quer dizer, se há quatro concorrentes, descabe cogitar monopólio. Contudo, é inegável que Darcy, por meio
do acordo com os controladores, domina o mercado, podendo, por exemplo, determinar aos administradores que
indicou para cada companhia a majoração concertada dos preços, sem riscos da clientela” – op. cit.
, p. 58.
19 Em relação à análise do art. 50 do Código Civil remetemos o leitor ao nosso estudo "A teoria da desconsideração
da personalidade jurídica no novo Código Civil",
Revista de Direito Privado
, n° 10, 2002, p. 69-85.
20 Neste sentido lecionou Rubens Requião (
“a
disregard doctrine
não visa a anular a personalidade jurídica, mas
somente objetiva desconsiderar no caso concreto, dentro de seus limites, a pessoa jurídica, em relação às pessoas
e os bens que atrás dela se escondem. É caso de declaração de ineficácia especial da personalidade jurídica para
determinados efeitos, prosseguindo, todavia, a mesma incólume para seus outros fins legítimos” – op. cit. p. 14),
no que foi seguido por Fábio Konder Comparato (“importa, no entanto, distinguir entre despersonalização e descon-
sideração (relativa) da personalidade jurídica. Na primeira, a pessoa coletiva desaparece como sujeito autônomo,
em razão da falta original ou superveniente das suas condições de existência, como, por exemplo, a invalidade do
contrato social ou a dissolução da sociedade. Na segunda, subsiste o princípio da autonomia subjetiva da pessoa
coletiva distinta da pessoa de seus sócios ou componentes. Mas essa distinção é afastada, provisoriamente e tão só
para o caso concreto”
,
op. cit.
p. 283).