

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 56 - 85, jul. - set. 2016
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Os atos e negócios jurídicos encontram a sua justificação, ou seja,
sua razão de existência em uma espécie de
causa-fim
, explicada por Fran-
cesco Messineo como a função ou finalidade socioeconômica a ser cum-
prida e que o ordenamento jurídico considera relevante para alcançar os
seus objetivos
22
. Não é diversa a condição da pessoa jurídica, pois, como
explica Leandro Javier Caputo,
“puede sustenerse que la causa-fin, desde
el punto objetivo, es la constitución de una persona jurídica a través de
cuya actuación se obtendrán utilidades, soportando el riesgo o las pérdi-
das, siendo la causa subjetiva o intención de las partes, el cumplimiento
del objeto social”
23
.
A postura legislativa propõe clara vinculação da
disregard doctrine
com a figura do abuso de direito, na própria dicção normativa consignada
no art. 187 da codificação civilista, ao dispor: “
Também comete ato ilícito
o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites
impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons cos-
tumes”
. Nas palavras de Alexandre Couto Silva,
“o ato abusivo é o mau uso
do direito, é um ato legal, porém contrário ao fim do instituto da pessoa
jurídica”
24
. Na mesma direção é a lição encontrada na doutrina jurídica
lusitana, na qual António Menezes Cordeiro é enfático ao afirmar que
“o
abuso do instituto da personalidade colectiva é uma situação de abuso de
direito ou de exercício inadmissível de posições jurídicas, verificada a pro-
pósito da actuação do visado, através duma pessoa colectiva”
25
.
O exercício da atividade econômica da pessoa jurídica somente se
mostra legítimo enquanto vinculado à finalidade que justifica a sua exis-
tência como entidade dotada de autonomia econômica e jurídica.
4.1.2. A confusão patrimonial
O Código Civil arrola também como motivo suficiente para justificar
a aplicação da teoria da desconsideração as situações de confusão patri-
monial, seguindo na esteira da doutrina estrangeira e atendendo a an-
22
Doctrina general del contrato
, Buenos Aires, El Foro, 1986, p. 110.
23
Inoponibilidad de la personalidade jurídica societaria
, Buenos Aires: Astrea, 2006, p. 95. Na mesma linha é a
lição de Joaquín Garrigues, ao afirmar: “la causa del contrato de sociedad está en la consecución del fin común, es
decir, en el ejercicio en común de una actividad económica que da lugar a una ganancia que más tarde ha de dividir-
se” (
Curso de Derecho Mercantil
, Tomo II, Bogotá: Editorial Themis, 1987, p. 34)
24
A aplicação da desconsideração da personalidade jurídica no Direito Brasileiro
, 2ª ed., Rio de Janeiro: Gen/
Forense, 2009, p. 82.
25
O levantamento da personalidade coletiva no direito civil e comercial,
Coimbra: Almedina, 2000, p. 123.