

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 285 - 304, jul. - set. 2016
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embora tenha sido uma das grandes responsáveis pelo começo de seu en-
fraquecimento, na medida em que, sendo a primeira de várias mulheres
que viriam, foi um dos gatilhos para o enfraquecimento da hegemonia pa-
triarcal, sua entrada e permanência na magistratura se estabelecem atra-
vés de uma postura mimética e pouco questionadora no que diz respeito
aos problemas de desigualdade de gênero dentro da instituição.
Iracema Garcia
Iracema Garcia foi a pioneira que só pude conhecer através do con-
tato com a APAMAGIS
7
. Praticamente não há nenhum registro virtual so-
bre a sua passagem na magistratura, até mesmo por ter passado apenas
11 anos na instituição. É a única das pioneiras que não chegou a desem-
bargadora, por ter se aposentado antes do tempo da promoção por an-
tiguidade
8
, devido a uma questão de adoecimento pelo trabalho deveras
exaustivo.
Sua chegada na magistratura foi um pouco diferente das outras en-
trevistadas, pois, segundo conta, ser juíza nunca foi um sonho acalentado
na juventude que a tenha feito planejar um curso de ação para esse fim.
Iracema foi também a que mais velha ingressou na instituição; foi apro-
vada apenas aos 44 anos de idade (juntamente com Zélia Antunes em
1981), no limite de idade para a aprovação (o máximo eram 45 anos para
funcionários públicos). Tinha 77 anos quando me concedeu a entrevista.
Contemporânea de Magui Azevedo, comentou igualmente que, na
sua juventude, todas as mocinhas faziam magistério. Muito embora, tal
qual a colega nordestina, não se empolgasse com a ideia em princípio, dis-
se que sua mãe lhe obrigou a cursá-lo, pois entendia que essa seria uma
forma de garantir a autonomia financeira da filha, já que Iracema não é de
família abastada. Sua mãe lhe disse que depois de arrumar um emprego
como professora, poderia escolher o curso de graduação que quisesse.
Exatamente por conta do trabalho que arrumou como professora,
Iracema foi fazendo uma série de especializações para o ensino de do-
7 Associação Paulista de Magistrados.
8 Há duas formas de promoção na magistratura: por antiguidade ou por merecimento. A primeira, autoexplicativa,
advém do tempo de serviço, e a segunda, por um “reconhecimento público” do trabalho. Normalmente, é uma gran-
de falácia. O “merecimento” nem sempre é factível; ele, na verdade, consiste majoritariamente em um “merecimen-
to político”. Através de
lobby
ou de um “bater de porta em porta” se tece uma rede de apoiadores que votarão no
seu nome como “merecedor” da promoção. Exige uma certa disposição para troca de favores e um grande traquejo
político, que, pelo que pude depreender nas entrevistas, não são muito comuns entre as mulheres. Nenhuma das
pioneiras foi promovida por merecimento, muito embora a excepcionalidade de suas carreiras.