

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 170 - 192, jul. - set. 2016
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E são através dos pretextos “nobres”, tais quais a prevenção geral, a
reinserção social, ou, atualmente com um discurso mais intenso, em prol
de uma segurança pública e da tranquilidade dos “cidadãos do bem”, que
o sistema punitivo retributivo ganha força perante a sociedade.
A partir dessa reflexão trazida pela criminologia crítica, averigua-
-se que há um hábito de punir que tem dominado a noção moderna de
justiça. Percebe-se que esse hábito corresponde à necessidade político-
-institucional, que anteriormente estava ligada ao processo de apropria-
ção da justiça, e que agora está na instrumentalização do direito penal
para manter o distanciamento e o isolamento de determinadas pessoas,
rotulando-os “inimigos” da sociedade.
A justiça restaurativa se encontra em outro nível, uma vez que pre-
tende abater esse sentimento punitivo, ao reconhecer esse meio de re-
solução de conflitos como uma etapa fundamental para a evolução da
vida comunitária, cuja harmonia é mais ameaçada do que preservada nas
tendências irracionais calcadas na punição.
A mediação, por não estar vinculada pelos rigores das normas pro-
cessuais e substanciais, acaba por consentir aos indivíduos a reapropria-
ção concreta de seus conflitos, tornando-os os sujeitos principais.
De acordo com Leonardo Sica: ”O reconhecimento recíproco que
nasce entre as pessoas diretamente envolvidas faz nascer um acordo que
até pode ser diverso daquele estabelecido pela lei, mas que por ser relacio-
nado com as expectativas dos indivíduos, deve ser, tendencialmente mais
equilibrado e congruente do ponto de vista distributivo/compensatório.”
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Verifica-se uma construção aberta e mais flexível, proveniente des-
se acordo, e se observa que a mediação implica uma forma de interpre-
tação distinta dessas leis e garantias, uma vez que sua finalidade está em
utilizar a lei como um referencial, para assim favorecer a aproximação en-
tre perspectivas diversas.
Evidencia-se que a mediação não representa um espaço privado da
lei, nem privatizado em relação àquela, uma vez que a mediação revela
sua total compatibilidade com o direito penal. No tocante às garantias do
devido processo legal, como o contraditório e a ampla defesa, de nada
adianta a observância formal desses princípios, se só contribuírem para
levar o acusado ao destino certo e seguro da punição severa.
8 SICA, Leonardo. "Justiça Restaurativa: Críticas e Contra Críticas".
RDPP
n. 47 Dez-Jan/2008 (Direito em Debate).