

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 75, p. 158 - 169, jul. - set. 2016
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BOA-FÉ OBJETIVA
A boa-fé objetiva é um princípio geral de valoração de comporta-
mentos, portanto, cláusula geral a fixar um padrão ético de confiança, ho-
nestidade e lealdade. Nas palavras de José de Oliveira Ascensão, “implica
sempre uma superação do formalismo, pois traz uma justiça substancial,
que se sobrepõe à justiça formal resultante da mera observação dos tex-
tos ou fórmulas negociais”
1
.
Em razão de se tratar de princípio geral e abstrato, deve ser a boa-fé
utilizada subsidiariamente, privilegiando o uso das regras concretamente
previstas.
Aplica-se a qualquer ramo do direito, visto que não se reporta a
modelos abstratos de conduta. Seu funcionamento se dá conforme os
ditames do caso concreto, o que permite reconhecer a existência de pa-
drões diferenciados de aplicação da boa-fé objetiva. Desse modo, a boa-fé
dos contratos empresariais não pode ser interpretada da mesma forma
que as demais espécies contratuais.
Em se tratando de relações negociais, pode-se afirmar que a boa-fé
obriga as partes a se comportarem de maneira a não prejudicar a contra-
parte ou, por vezes, a salvaguardar o interesse adverso. Incumbe ressaltar
que a boa-fé age em toda a formação contratual, em seu conteúdo e em
sua execução.
Na hipótese de alienação fiduciária tratada no presente ensaio, a
boa-fé objetiva exige dos contratantes cooperação, a limitar direitos sub-
jetivos, como o direito creditício em favor do devedor/sociedade recupe-
randa, com a finalidade de manter uma relação obrigacional equilibrada.
Especificamente no tocante aos contratos empresariais, válido des-
tacar que ambas as partes contraentes buscam o lucro bilateral e possuem
pleno conhecimento sobre o negócio acordado. Os empresários realizam
pesquisas e cálculos direcionados a aferir os riscos da celebração do con-
trato, até porque desempenham a atividade habitualmente.
Diz-se, portanto, que vigora, nessa espécie contratual, a presunção
de “hipersuficiência” dos agentes ou de comportamento dos “comercian-
tes cordatos”. Dessa forma, “o ordenamento jurídico autoriza a pressu-
posição de que o agente econômico, de forma prudente e sensata, ava-
1 ASCENSÃO, José de Oliveira.
Direito Civil – Teoria Geral
, volume III. Coimbra: Ed. Coimbra, 2002, p. 182.