Background Image
Table of Contents Table of Contents
Previous Page  82 / 210 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 82 / 210 Next Page
Page Background

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 74, p. 77 - 97. 2016

80

pessoal do proprietário da embarcação e não necessariamente do navio

arrestado.

Por sua vez, essa modalidade de ação cautelar, fundada em crédito

in personae

em face do armador, encontra respaldo no Código de Proces-

so Civil, ensejando que o devedor, em hipóteses de responsabilidade civil

e desde que presentes os requisitos processuais, venha a responder por

seus débitos , com todos os seus bens, incluindo suas embarcações, sejam

quais e quantas forem, até a satisfação integral da dívida.

Embora Código Comercial de 1850 trate detalhadamente da ma-

téria inerente ao embargo de navio, não é surpresa que este se encontra,

em certos aspectos

3

, defasado da realidade mercantil marítima.

3 Até hoje subsistem no referido Código disposições como as dos artigos 601, 602 e 603 , disciplinando que o capitão

pode ser obrigado pelos carregadores de carga a “fazer-se à vela” com sua embarcação e que, “não tendo o capitão

fixado o tempo da partida, é obrigado a sair com o primeiro vento favorável depois que tiver recebido mais de dois

terços da carga correspondente à lotação do navio” (art. 603 do Código Comercial), os quais acabaram tendo que

serem readaptados e reinterpretados com o passar do tempo. Outros dispositivos também atribuem ao capitão

prerrogativas que hoje não mais se aplicam, como por exemplo aquelas dos artigos 494, 499, 500, 513 e 531, listados

abaixo. Pois bem, tais regras, a exemplo de outras tantas, caíram em desuso e já tiveram sua eficácia afastada em

distintas oportunidades pelas cortes brasileiras e pela doutrina, demonstrando que a prática forense e comercial

tem conseguido se adaptar mesmo na inércia em relação à renovação legislativa.

Art. 601 do Código Comercial: Estando o navio a frete de carga geral, não pode o capitão, depois que tiver recebido

alguma parte da carga, recusar-se a receber a mais que se lhe oferecer por frete igual, não achando outro mais van-

tajoso; pena de poder ser compelido pelos carregadores dos efeitos recebidos a que se faça à vela com o primeiro

vento favorável, e de pagar as perdas e danos que da demora resultarem.

Art. 602 do Código Comercial - Se o capitão, quando tomar frete à colheita ou à prancha, fixar o tempo durante o

qual a embarcação estará à carga, findo o tempo marcado será obrigado a partir com o primeiro vento favorável;

pena de responder pelas perdas e danos que resultarem do retardamento da viagem; salvo convindo na demora

a maioria dos carregadores em relação ao valor do frete.

Art. 603 do Código Comercial: Não tendo o capitão fixado o tempo da partida, é obrigado a sair com o primeiro

vento favorável depois que tiver recebido mais de dois terços da carga correspondente à lotação do navio, se

assim o exigir a maioria dos carregadores em relação ao valor do frete, sem que nenhum dos outros possa retirar

as fazendas que tiver a bordo.

Art. 494 do Código Comercial disciplina a regra do abandono liberatório da embarcação como forma de limitação

da responsabilidade do armador, estabelecendo o seguinte: “

Todos os proprietários e compartes são solidariamente

responsáveis pelas dívidas que o capitão contrair para consertar, habilitar e aprovisionar o navio; sem que esta

responsabilidade possa ser ilidida, alegando-se que o capitão excedeu os limites das suas faculdades, ou instruções,

se os credores provarem que a quantia pedida foi empregada a benefício do navio (artigo nº. 517). Os mesmos

proprietários e compartes são solidariamente responsáveis pelos prejuízos que o capitão causar a terceiro por falta

da diligência que é obrigado a empregar para boa guarda, acondicionamento e conservação dos efeitos recebidos a

bordo (artigo nº. 519). Esta responsabilidade cessa, fazendo aqueles abandono do navio e fretes vencidos e a vencer

na respectiva viagem. Não é permitido o abandono ao proprietário ou comparte que for ao mesmo tempo capitão do

navio

”. Tal norma já teve a sua eficácia afastada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em acórdão relacionado

ao abalroamento envolvendo o navio tanque Norsul Tubarão e o graneleiro Global Rio, a seguir destacado: Ementa:

Embargos de Declaração opostos em face de Acórdão desta Câmara, em sede apelatória, pela parte recorrente, no

sustentar de omissão e de erro material. (...) Argumento envolvendo o abandono liberatório, que não prospera; é que

tal instituto, previsto no artigo 494 do Código Comercial/1850, perdeu eficácia, ao ser editado o Decreto 350/1935,

que ratificou a Convenção Internacional de Bruxelas, sobre unificação de regras relativas à limitação da respon-

sabilidade dos proprietários de navios. Ademais, Código referido, cuja leitura deve ser consentânea à evolução da

legislação brasileira nos 160 anos que já se lhe seguiram. Aliás, desde quando editado o Código de Clóvis Bevilaqua,

no estatuir da responsabilidade do patrão pelos atos do empregado, não mais é cabível cuidar-se de responsabili-

dade autônoma dos capitães de navio, por separado da responsabilidade dos armadores, estes com fulcro na culpa

in eligendo. Artigos 927, 932, III, 933, 942 e 944, do Código Civil vigente, no corroborar. Pretendida compensação