

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 74, p. 108 - 134. 2016
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meira categoria fornecedores navais de vários tipos, diversos prestadores
de serviços, seguradores e agentes marítimos. Na outra categoria estão
especialmente as vítimas de abalroações, colisões, naufrágios, varações
e incidentes ambientais. Personagens de ambas as categorias vieram jun-
tar-se à tripulação e ao Estado, ambos credores suprapreferenciais.
E, refletindo essa mudança de valores, novas normas foram sendo
progressivamente editadas, removendo os antigos obstáculos e conse-
quentemente franqueando o amplo acesso de credores, privilegiados ou
não, às medidas que visam a paralisar a movimentação de embarcações
em razão de dívidas. Normas legais supervenientes, antinômicas à antiga
disciplina do art. 480 do Código Comercial podem ser hoje encontradas
no art. VI, itens 1b e 2, da Convenção Internacional sobre Responsabi-
lidade Civil em Danos Causados por Poluição por Óleo de 1969 (CLC/69
- Decreto nº 79.437/77), que criou a hipótese de arresto incondicionado
de embarcação “por danos causados por poluição”; o art. 12, § 1º, inciso
I da Lei nº 7.203/84, prevendo
tout court
o embargo da embarcação que
tiver recebido assistência ou salvamento, como garantia da remuneração
devida ao salvador; e o já citado art. 679 do CPC, que passou a autorizar o
embargo a título de penhora da embarcação, inclusive com sua eventual
retirada de tráfego na ausência dos seguros necessários, e, evidentemen-
te, com base no poder geral de condução do processo, também se existir
risco de ela ser desviada e subtraída ao juízo da execução.
Tanto a nova valoração do assunto como a intercorrência de novas
normas constituem hipóteses clássicas a impor ao intérprete a revisão do
sentido da lei. “
Muitas e muitas vezes
” ― nos relembra o mestre MIGUEL
REALE ― “
as palavras das leis conservam-se imutáveis, mas a sua acep-
ção sofre um processo de erosão ou, ao contrário, de enriquecimento, em
virtude da interferência de fatores diversos que vêm amoldar a letra da
lei a um novo espírito, a uma imprevista ratio juris
”
(42)
. Isso se dá, quanto
a um determinado texto legal, seja quando “
se altera o prisma histórico-
social de sua aferição axiol
ógic
a
”, seja “
em virtude da promulgação de
leis que vêm estabelecer categorias ou padrões jurídicos diversos, de tal
modo que o intérprete, por dever de unidade sistemática ou de coerência
lógica na totalidade do ordenamento
, não pode deixar de rever as teorias
consagradas na exegese de um texto legal determinado”
43
.
42
Filosofia do Direito
, p. 566/567, Saraiva, 15ª ed., 1993. Os grifos estão no original.
43 Idem, p. 568/569. Os grifos estão de novo no original.