

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 74, p. 108 - 134. 2016
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Dito de outra maneira, mais afeita a conceitos jurídicos atuais, no
diálogo das fontes,
o art. 482 não tem como permanecer válido e eficaz
sob a ordem jurídica atual
(28)
.
Equivocadas, portanto, doutrina
(29)
e jurisprudência
(30)
que, inad-
vertidamente, continuam por vezes a invocar tal dispositivo, de longa
data proscrito.
Diante da revogação do art. 482 do Código Comercial, tem entendi-
do a jurisprudência, com a aprovação unânime da doutrina, que o embar-
go de embarcações estrangeiras fica consequentemente sujeito às nor-
mas análogas destinadas ao embargo de embarcações nacionais, o que
iremos examinar a seguir.
6.2. O Embargo de embarcação nacional
O embargo ou detenção de embarcação nacional vem disciplinado
nos arts. 479, 480 e 481 do Código Comercial. Por sua vez, o art. 483
(31)
,
embora também relativo ao assunto, encontra-se revogado pelo art. 679
do CPC, que dispôs integralmente sobre a matéria, até com maior ampli-
tude, abrangendo a execução que recai sobre embarcação em regime de
propriedade singular ou de copropriedade.
Nota-se claramente nesses dispositivos a tensão inerente entre o
princípio do cumprimento da viagem marítima e aquele outro que privile-
gia a garantia patrimonial nas relações de direito marítimo, este último já
naquela época restringindo, em pequena medida, o primeiro.
Mudanças na legislação provocadas, mais do que tudo, pela mu-
dança dos
valores tutelados pela ordem jurídica
no âmbito do Direito Ma-
rítimo ao longo de um século e meio desde a edição do Código Comercial,
têm implicado na reavaliação da vigência dessas normas sob o prisma da
28 NELSON CAVALCANTE e WERNER BRAUN RIZK, ob. cit. passim, desenvolvem ainda outro fundamento interessan-
te para a revogação do art. 482 do Código Comercial, ao lado dos arts. 480 e 481, qual seja a da incompatibilidade
desses dispositivos com o conceito da função social do direito.
29 Ainda aplicando o art. 482 do Código Comercial sem sequer mencionar as opiniões e farta jurisprudência contrá-
rias, OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA,
Comentários ao CPC
, v. XI, p. 284, Lejur, 2ª ed., 1986.
30 Assim, por exemplo, o acórdão proferido na Apelação Cível nº 17.4386-4, de 01/10/2001, proferido pela 6ª
Câmara do TJ-PR: “MEDIDA CAUTELAR INOMINADA. AÇÃO DE COBRANÇA. ARRESTO. NAVIO. DÍVIDA NÃO CON-
TRAÍDA EM TERRITÓRIO BRASILEIRO. IMPOSSIBILIDADE. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO.
ACERTAMENTO”. Também equivocadamente, utilizando o art. 482 como uma de suas razões de decidir, o acórdão
do Agravo de Instrumento nº 0150246-91.2012.826.0000, proferido pela 27ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP,
Rel. Des. Morais Pucci, julg. em 31/07/2012.
31 Art. 483 - "Nenhum navio pode ser detido ou embargado, nem executado na sua totalidade por dívidas particu-
lares de um comparte; poderá, porém, ter lugar a execução no valor do quinhão do devedor, sem prejuízo da livre
navegação do mesmo navio, prestando os mais compartes fiança idônea.”