

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 84 - 97, mai. - jun. 2016
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Os que sobrevivem, conseguem fazer o movimento involuntá-
rio de engolir, respirar e manter os batimentos cardíacos, já
que essas funções são controladas pelo tronco cerebral, a re-
gião que não é atingida pela anomalia. Alguns não precisam
do auxílio de aparelhos e chegam até a ser levados para casa,
mas vivem em estado vegetativo, sem a parte da consciência,
que é de responsabilidade do cérebro. (GODIM, 2012)
A gravidez de anencéfalo tem sempre a morte do bebê como des-
fecho. Anteriormente ao julgamento da arguição, as gestantes que dese-
javam encurtar o sofrimento de uma gravidez dessa natureza precisavam
recorrer individualmente ao Poder Judiciário com pouca chance de su-
cesso, uma vez que não havia uma uniformização da jurisprudência e, na
maioria dos casos, a decisão somente ocorria após o nascimento.
Há que se destacar, ainda, nesta contextualização que o Brasil
possui uma das legislações mais restritivas em termos de aborto e que
até recentemente, ou seja, antes da decisão, obrigava as mulheres a se
manterem grávidas a despeito do diagnóstico da inviabilidade fetal. A in-
definição quanto ao caráter do procedimento vinha se arrastando havia
mais de uma década, repercutindo no âmbito jurídico e suscitando ques-
tionamentos na sociedade brasileira. Isso porque, no país, a interrupção
voluntária da gravidez, o aborto, é tema polêmico, que suscita dúvidas e
incertezas quanto a sua descriminalização, bem como movimenta lutas
por sua proibição absoluta e incondicional.
O Código Penal (CP) brasileiro proíbe a prática, exceto: I - Se não
há outro meio de salvar a vida da gestante e; II - Se a gravidez resulta de
estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quan-
do incapaz, de seu representante legal. Em 12 de abril de 2012, a ADPF
54 foi julgada procedente por maioria dos votos. Considerou-se que as
mulheres que decidem “antecipar o parto” em casos de gravidez de feto
anencéfalo não estariam praticando crime tipi cado no Código Penal. O
principal argumento proposto na ação era de que, por ser a anencefalia
uma má-formação incompatível com a sobrevida do feto fora do útero, a
interrupção da gestação não deveria ser tipificada, mas considerada como
um procedimento médico amparado em princípios constitucionais supra-
mencionados.