

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 77 - 83, abr. - jun. 2016
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reu, dar à Lei Penal,
in casu
, aos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, in-
terpretação com a intenção de:
Verbis
“inserir conteúdos”, sob pena de
usurpação da competência para legislar que é do Poder Legislativo.
Com efeito, como é sabido, o aborto constitui crime, tipificado nos
artigos 124
usque
127 do Código Penal.
As duas únicas hipóteses em que a prática abortiva não é conside-
rada crime são as previstas nos incisos I e II do artigo 128, do Código cita-
do, ou seja, quando a interrupção da gravidez precisa ser feita para salvar
a vida da gestante (inciso I) e no caso de gravidez resultante de estupro
(inciso II).
O aborto de feto anencéfalo, evidentemente, não se inclui em ne-
nhuma das hipóteses excludentes de criminalidade, no artigo 128 do Có-
digo Penal previstas.
Destarte, o que se fez no v. acórdão do STF, sob apreciação, foi, na
verdade, o reconhecimento de uma terceira excludente de criminalidade,
no texto legal não prevista, nesse passo - como observou o voto vencido do
Ministro Lewandowiski - invadindo a competência do Poder Legislativo.
A observação feita, no voto do Ministro Lewandowiski, parece-nos
perfeita e de absoluta pertinência, merecendo o destaque e as conside-
rações que ora fazemos, para deixar registrado que o nosso entendimen-
to sobre a matéria, coincide, inteiramente, com o contido naquele douto
pronunciamento, ou seja, o de que não é possível, a pretexto de interpre-
tar uma lei, fazê-lo de modo a nela inserir conteúdos inexistentes.
É certo que o juiz ao interpretar um texto legal, para aplicá-lo a
uma hipótese concreta, pode fazê-lo, em certos casos,
cum grano salis
,
de modo a dar, à referida hipótese, solução ao mesmo tempo legal e justa.
Na interpretação da norma legal, porém - como advertiu o Ministro
Carlos Alberto Menezes Direito, em Estudo Jurídico, publicado na Revista
da EMERJ, vol. 3, nº 11, páginas 24/42 - “não pode o juiz, em regra, mo-
dificá-la, para aplicá-la, ao caso concreto, como se livre fosse o direito,
embora possa adaptá-la à realidade”.
Isto porque, como ensina o magistério de Lopes da Costa: ”O juiz não
é legislador. A autoridade de suas decisões assenta na autoridade da Lei”.
Foi em harmonia com esses doutos ensinamentos, que votou venci-
do, o Ministro Cesar Peluso, quando do julgamento, no Supremo Tribunal
Federal, da Arguição do Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54,