

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 38 - 54, abr. - jun. 2016
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ra no início do século XX eram os de indivíduos que se intoxicavam por
conta própria.
De acordo com Carneiro (1993), os enunciados aprazíveis noticia-
dos pela imprensa brasileira acerca do consumo de drogas passam a assu-
mir outra entonação a partir do ano de 1912. Nesse ano, tornam-se mais
frequentes notícias na imprensa referentes aos prováveis “malefícios” do
abuso de drogas, como o aumento das taxas de suicídio e crimes decor-
rentes do consumo dessas substâncias. Na mesma época, alguns grupos
iniciam campanhas de denúncia nos moldes dos existentes no território
norte-americano. A divulgação pela imprensa dessas informações favo-
receram a retórica política dos empreendedores morais
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que almejavam
aprovar políticas de controle sobre as drogas que não fossem restritas ao
poder sanitário, mas também pelas políticas de segurança pública presen-
tes no Código Penal brasileiro de 1911.
O Código Penal brasileiro de 1911 foi o primeiro a estabelecer res-
trições ao consumo de algumas substâncias. No entanto, foi o Decreto nº
2.114, de 14 de novembro de 1911, promulgado pelo governo do Estado
de São Paulo, que constitui a especialização de atividades que almejam
inspecionar e controlar o funcionamento das farmácias e drogarias na
época. Essa política sanitária teve como finalidade garantir o cumprimen-
to das leis relativas à prevenção e repressão a todo o ato que comprome-
tesse a saúde pública. O Decreto nº 2.114, juntamente com Decreto nº
847, de 11 de outubro de 1890, que estabelece o controle sobre as vendas
de venenos, foram os primeiros dispositivos
legais regulando ou proibin-
do a venda de substâncias no território brasileiro.
Podemos notar uma transição no referente regime de verdade
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ini-
ciando uma mudança na maneira de tratar a temática, acarretando a ela-
boração de uma série de dispositivos que serão exportados dos Estados
Unidos para diversas regiões do mundo. Nesse contexto, a importância
dos tratados internacionais é inquestionável para a disseminação dos pre-
ceitos proibicionistas de drogas pelo mundo.
2 Segundo Becker (2008, p. 153) empreendedores morais são atores que têm a iniciativa de produzir regras. O autor
classifica os empreendedores em duas categorias: os criadores de regras e os impositores de regras.
3 Michel Foucault não se preocupa em conceituar o que é verdade, mas procura questionar por que alguns discur-
sos são considerados verdades perante os demais. Nesse contexto, regime de verdade será compreendido nessa
dissertação como um tipo de discurso verdadeiro acolhido pela sociedade. Cabe destacar que esse discurso não está
isento de interesses políticos, econômicos e morais.