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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 9 - 30, abr.-jun.. 2016
A relativização do princípio da autonomia da vontade [auto-
nomia privada] e da liberdade contratual encontra respaldo
nas teorias referentes à constitucionalização das relações
privadas, no sentido de que, atualmente, o Direito Civil deve
ser revisado e transformado em razão da normativa consti-
tucional, não podendo mais ser estudado e aplicado como
um bloco separado. O ordenamento jurídico brasileiro é um
todo coerente. Não se poderia permitir a plenitude e a intan-
gibilidade da autonomia da vontade [autonomia privada],
em detrimento da dignidade e dos direitos fundamentais das
partes contratantes.
(SALES, s.d., s.p.).
Com isso, os valores primordiais das relações privadas devem obe-
diência aos valores preconizados pelo legislador constituinte, e a liber-
dade relacionada ao contrato, sucedânea dos princípios norteadores do
contrato, como autonomia da vontade e autonomia privada, fica condicio-
nada aos preceitos expressos e axiológicos da Constituição da República.
Um interessante caso sobre essa temática diz respeito à ementa do
julgamento do Recurso Extraordinário n. 201.819 pelo Supremo Tribunal
Federal
10
.
II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTO-
NOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-cons-
titucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil
a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas
leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamen-
to direto o próprio texto da Constituição da República, no-
tadamente em tema de proteção às liberdades e garantias
fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido
pela Constituição às associações não está imune à incidên-
cia dos princípios constitucionais que asseguram o respeito
aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia
devedores inadimplentes. 2. Pretensão de declaração da inexigibilidade do débito e de retirada da negativação nos
órgãos de proteção ao crédito. 3. Mesmo ausente a prova formal do pedido de encerramento da conta por parte do
correntista, não é cabível a cobrança de qualquer taxa ou encargo, em razão da necessidade de observância do dever
de lealdade derivado do princípio da boa-fé objetiva. 4. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. (
RECURSO ESPECIAL Nº
1.337.002 - RS (2012/0162018-6) RELATOR: MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
)
10 Relevante notar que a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em um mesmo tópico do julgado,
utiliza as expressões ‘autonomia privada’ e ‘autonomia da vontade’ como sinônimas. Isso demonstra que a utiliza-
ção genérica de um pelo outro, na prática, ainda é recorrente. Não obstante, como já afirmado, este trabalho opta,
teoricamente, pela utilização do princípio da autonomia privada.