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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 9 - 30, abr.-jun.. 2016
balterno, mas com caráter normativo; c) a autonomia pri-
vada revelando um poder normativo conferido pela lei aos
indivíduos, que o exerceriam nos limites e em razão dessa úl-
tima e de seus valores; d) a autonomia privada tida como um
poder outorgado pelo Estado aos indivíduos.
A autonomia da vontade revelava um poder imanente do indiví-
duo; na autonomia privada, o indivíduo detém um poder outorgado pelo
Estado. Ainda, na autonomia da vontade, o que se tinha como valor era
o individualismo; na autonomia privada, o social. Dessa forma se ergue a
justificativa para a intervenção estatal na disciplina contratual.
Assim, “sob a escusa de afastar a superada visão de autonomia da
vontade, permeada de insustentável individualismo, recorreu-se ao inter-
vencionismo legal e judicial do Estado como forma de coibir os abusos da
liberdade pelos particulares” (RODRIGUES JÚNIOR, 2004, p. 122).
Portanto, o contrato no ordenamento jurídico de hoje é um instru-
mento que, além de exteriorizar acordos e criar obrigações, tem sempre
a regulamentação e vigília do Estado
3
sobre ele a fim de garantir a não
arbitrariedade de uma parte sobre a outra na relação jurídica.
3 A constitucionalização do direito civil e suas conse-
quências para a liberdade relacionada ao contrato
Como já foi abordado, os valores primordiais das relações privadas
estão hoje inseridos no bojo da Constituição, e o direito civil foi relido a
partir dos termos da Lei Maior. A constitucionalização do direito civil ge-
rou e continua gerando consequências para a teoria contratual e, mais es-
pecificamente, para a liberdade relacionada ao contrato, sendo que prin-
cípios como o da autonomia da vontade e autonomia privada sofreram/
sofrem alterações semânticas.
No entanto, nota-se que a liberdade contratual hoje não é absolu-
ta, pois está limitada pela supremacia da ordem pública, que veda con-
venções que lhe sejam contrárias e aos bons costumes, de forma que a
vontade dos contratantes está subordinada ao interesse social. Mais do
3 Aqui não se esquiva do princípio da inércia da jurisdição (art. 2 º CPC). O que se tenta deixar claro é que os particu-
lares, enquanto partes, diante de um contrato, podem acionar o Judiciário para que este o reveja. Ainda, o mesmo
pode ser feito através de instituições em nome da coletividade, como o Ministério Público.