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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 9 - 30, abr.-jun.. 2016
à proteção dos particulares em face dos poderes privados.
(Grifo nosso).
O que se pode notar é a utilização de interpretações baseadas na
Constituição, com foco nos direitos fundamentais, cada vez mais voltadas
para a interação com as relações privadas.
Concluída essa análise sobre o que vem a ser a constitucionalização
do direito civil e como se dá a aplicabilidade dos direitos fundamentais en-
tre os particulares, passa-se a outra abordagem, qual seja: evolução histó-
rica do princípio da autonomia da vontade para o princípio da autonomia
privada, trazendo assim a evolução da ideia de liberdade relacionada ao
contrato; e após, as consequências do processo de constitucionalização
do direito civil na liberdade relacionada ao contrato.
Assim, com a constitucionalização do direito civil, altera-se tam-
bém a interpretação e incidência dos princípios que regem os negócios
jurídicos, e, mais especificamente no que tange aos contratos, interfere
na aplicabilidade do princípio da autonomia privada, cerne evolutivo do
princípio da autonomia da vontade e parâmetro da teoria contratual e das
relações privadas.
2. Princípio da autonomia da vontade e princípio da auto-
nomia privada na seara contratual – a evolução da liber-
dade relacionada ao contrato
O princípio da autonomia privada é comumente confundido com o
princípio da autonomia da vontade
1-2
. Na doutrina brasileira, vários auto-
res utilizam um como sendo o outro ou até mesmo colocam os dois como
1 Essa confusão ainda hoje é comum na doutrina civilística brasileira. Vários autores, como Maria Helena Diniz e
Carlos Roberto Gonçalves, não consagram a autonomia privada como princípio fundamental do direito contratu-
al. Alocam no princípio da autonomia da vontade tanto a liberdade de contratar quanto a liberdade contratual e
sequer fazem menção à autonomia privada. É assim, por exemplo, na ideia de Maria Helena Diniz. Para a autora,
o princípio da autonomia da vontade é aquele no qual se origina a liberdade contratual dos contratantes, e con-
siste no poder de estipular livremente e de maneira plena, como melhor convier às partes, mediante acordo de
vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. Essa autorregulamen-
tação dos interesses das partes contratantes, condensado nesse princípio, envolve liberdade contratual, que é
a de determinação do conteúdo da avença e a de criação de contratos atípicos, e liberdade de contratar, alusiva
de celebrar ou não o contrato e à de escolher a outra parte contratante. Portanto, além da liberdade de criação
do contrato, abrange a liberdade de contratar ou não contratar, a liberdade de escolher o outro contratante, a
liberdade de fixar o conteúdo do contrato (DINIZ, 2009).
2 Antes de tudo, esclareço que este trabalho opta pela distinção acadêmica dos dois princípios (autonomia da von-
tade e autonomia privada), como seguirá no corpo do texto e tem como referencial teórico para essa distinção os
ensinamentos de Otávio Luiz Rodrigues Júnior (2004). No entanto, ressalta-se que esta distinção tem sido contem-
plada somente na Doutrina, e de forma incipiente.