

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 185 - 217, abr. - jun 2016
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(...) “A violação à norma constitucional, para fins de admissibilidade de
rescisória, é sem dúvida algo mais grave que a violação à lei. Isto já havia
sido intuído por Pontes de Miranda ao discorrer especificamente sobre a
hipótese de rescisória hoje descrita no art. 485, inciso V, do CPC. Sobre
a violação à Constituição como pressuposto para a ação rescisória, dizia
Pontes que ‘o direito constitucional é direito, como os outros ramos. Não
o é menos; em certo sentido, é ainda mais’”.
De plano, duas considerações. A primeira é que inexiste qualquer
diferença entre a interpretação constitucional e a infraconstitucional, pois
“em ambos os casos é necessário individualizar sentidos possíveis, valorá-
-los e escolher aquele que encontra maior suporte na ordem jurídica”.
102
A segunda é que o STF é tão intérprete último da Constituição Federal
quanto o é o STJ da legislação federal. Sem assomos de vaidade, cada qual
é Corte Suprema em sua esfera de competências. Ambos possuem, como
se sói dizer, a prerrogativa de
errar por último
, já que fixam, em caráter
irrecorrível, em seus âmbitos de atribuições, uma dentre as várias possibi-
lidades hermenêuticas.
103
Não há que se falar em um Tribunal Superior
do
A
e outro
do B
na perspectiva de uma assimetria nomofilácica.
É preciso, ademais, contextualizar a citação realizada pelo Min.
Gilmar Mendes. Trata-se da segunda frase de um parágrafo que principia
com a desaprovação de Pontes a dois acórdãos do TJSP que ostentam a
seguinte ementa: “A sentença que julga contrária à Constituição regra
jurídica de decreto ou lei não é suscetível de rescisão”.
104
Com a devida vênia ao Ministro, o objetivo de Pontes é simples-
mente afirmar que a Lei Fundamental também é “lei” para fins de res-
cisão. Nada mais. Conquanto essa assertiva, hoje, seja elementar, não o
era em meados do século XX, época na qual vicejava uma percepção de
baixa normatividade
das leis supremas.
105
A ascensão das constituições ao
patamar normativo é fenômeno relativamente recente, remontando, no
cenário pátrio, à Carta de 88. Outrora, como é cediço, eram vistas como
programas políticos e cartas de intenções desprovidas de vinculatividade,
de maneira que o enquadramento das normas constitucionais no concei-
102 Mitidiero,
op. cit
., p. 80.
103 É por isso que o STF deve obediência à interpretação do STJ ao julgar ação de competência originária que verse
lei federal.
104
Comentários ao Código de Processo Civil
, Tomo VI (Arts. 476-495). Rio de Janeiro: Forense, 1974, p. 296.
105 Ao dissertar sobre a supremacia da lei no Estado Liberal, assim se manifesta Gustavo Zagrebelsky:
“L´espressione
giuridica di questa egemonia era la legge alla quale, per conseguenza, era riconnosciuto il primato tra tutti gli atti
giuridici e anche rispetto ai documenti costituzionale di allora”
(
op. cit
., p. 35).