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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 185 - 217, abr. - jun 2016

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que as expectativas legítimas dos jurisdicionados devem se cingir a “la

mejor justificación posible, no a soluciones absolutamente correctas”.

93

Deveras, é inequívoca a impossibilidade de se assegurar qual decisão é a

única correta, tendo em vista que a lei não possui um significado trans-

cendente e tampouco é aplicada à revelia das valorações do intérprete.

94

O autor faz interessantes críticas ao juiz Hércules,

95

conhecido ideal

regulativo de Dworkin que “dotado de sabedoria, paciência e sagacidade

sobre-humanas, e orientado pelos princípios e capaz de identificá-los nas

controvérsias, alcançaria o melhor julgamento de um caso”.

96

Em antago-

nismo a essa ficção, finca a racionalidade do discurso nas teorias da

ar-

gumentação jurídica

,

auditório universal

e

princípio majoritário

, as quais,

por si sós, demandariam um artigo

ad hoc

.

97

93 Idem, p. 31.

94 “A interpretação da norma jurídica pode ser divergente, e nada há de equivocado nisto. Afinal, a interpretação

varia conforme o intérprete, que jamais é neutro em sua exegese. Cada intérprete afirma o sentido da norma jurídica

que lhe parece apropriado conforme seus próprios valores e a partir de sua visão pessoal de mundo. Assim, não

se pode considerar que dada interpretação é certa ou errada. A interpretação é um horizonte aberto que conhece

possibilidades e alternativas diversas. Deste modo, é de se afirmar que qualquer interpretação razoável da norma

jurídica é compatível com a norma interpretada e, por isso, não a ofende. Por tal razão, não se pode rescindir um

provimento judicial pelo simples fato de se ter baseado em uma das diversas possíveis interpretações da mesma

norma jurídica. É verdade, porém, que para os que não estão habituados com o estudo da ciência jurídica, isso

pode parecer aberrante. Afinal, pode mesmo acontecer de duas pessoas em situações jurídicas substancialmente

iguais chegarem a resultados diferentes porque magistrados distintos julgaram suas causas. Cabe, porém, ao

advogado advertir seu cliente sobre esse risco e tentar explicar as razões dessa possibilidade” (Câmara, Alexandre

Freitas.

op. ci

t., p. 86).

95 Uma delas decorre do impasse lógico a que se chegaria caso se admitisse a possibilidade de uma mesma questão

controvertida ser submetida à apreciação de dois juízes Hércules, veja-se:

“Una manera de formular el núcleo de la

crítica es preguntar: qué ocurre si hay dos Hércules J.? Ambos son ciertamente seres racionales pero son capaces de

resolver genuínos problemas axiológicos? Esto es importante, porque las elecciones finales en el razonamiento jurídico

no descansan solamente sobre la racionalidad del procedimiento del razonamiento y las estructuras libres que asegu-

ran la discusión ideal. El outro factor decisivo es el input, es decir, los datos que se introducen em la discussión. En fin,

Hércules J. también está vinculado v. g. a los intereses que presenta o está obligado a presentar en el discurso. Hablando

toscamente, ellos no abordan el problema desde el mismo – o incluso similar – punto de vista. Por consiguiente dos o

más Hércules J. pueden alcanzar varias respuestas no equivalentes pero igualmente bien fundadas”.

("La tesis"..., p. 32).

Em sentido semelhante, Marcelo Neves ao afirmar que o juiz Hércules, “monológico e solipsista”, não atenta para o

fato de que “o problema não reside na discricionariedade (do intérprete), mas sim na forma seletiva de estruturação da

complexidade. A produção normativa constituinte ou legislativa (em sentido amplo) importa já uma forte redução ou

estruturação seletiva de expectativas normativas existentes na sociedade sobre quais são os direitos e os deveres. Essa

seleção pelos procedimentos constituintes ou legislativos não esgota o processo seletivo. A interpretação dos textos

constitucionais e legais e a respectiva concretização normativa perante o caso importam uma nova seleção sobre as

diversas expectativas normativas e também cognitivas que se desenvolvem em torno de definir-se quais os direitos e

os deveres estabelecidos na Constituição e nas leis” (

Entre Hércules e Hidra – princípios e regras constitucionais como

diferença paradoxal do sistema jurídico

, São Paulo: Martins Fontes, 2013, p. 57).

96

Levando os direitos a sério

..., p. 165.

97 Para fins de aprofundamento, recomenda-se, do mesmo autor,

"Sobre la ambigüedad semántica..." ,

p. 115 e

ss. Ricardo Luis Lorenzetti, da mesma forma, refuta a tese da resposta correta ao aludir à migração de um contexto

de descobrimento para um de justificação (

Teoria da decisão judicial

, 2ª ed., São Paulo: RT, 2010, p. 157, 163, 169,

172, 178 e 182). Domingo Garcia Belaunde também enfoca a necessidade de que as consequências do processo

interpretativo configurem o resultado de uma argumentação jurídica que possa justificar-se por si mesma, que não

seja arbitrária ou caótica, mas tampouco única ou absoluta (

Op. cit.

, p. 26

et passim

).