

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 185 - 217, abr. - jun 2016
186
Nessa linha de considerações, o estudo parte da premissa de que,
em relação ao processo, há uma nítida
ponte de entrada
e outra de
saída
do direito material que se vislumbra nos lindes do estado de litispendência.
A primeira verifica-se a partir da propositura da demanda judicial,
que nada mais representa senão a forma pela qual o direito material in-
gressa no processo, ou seja, é o ponto de passagem entre o cumprimento
voluntário das normas jurídicas e a observância imposta autoritativamen-
te pelo Estado.
A segunda
ponte
, por sua vez, relaciona-se com a forma pela qual o
direito substancial sai do processo, na medida em que apenas no caso de
julgamento procedente coincidirá com o sentido, extensão e o significado
afirmados pelo autor em sua petição inicial. A sentença recorrível já é um
primeiro aceno a respeito da disciplina normativa que deverá reger a con-
duta das partes. Mas, em virtude de estar sujeita à cassação ou revisão, não
é necessariamente o último ponto de contacto entre os direitos processual
e substancial, pois outra norma jurídica do caso concreto poderá ser ditada
pelo órgão jurisdicional superior (efeito substitutivo dos recursos).
Com o trânsito em julgado e a formação da coisa julgada material,
2
porém,
tollitur quaestio
: a ponte derradeira - salvo vício de rescindibilida-
de - é alçada e não cabe mais discutir os ditames do
dever-ser
ou even-
tual injustiça da decisão. Na vida em geral, e no processo em particular,
é preciso que se pratique um
trade-off
entre os distintos interesses que
concorrem em uma determinada tomada de decisão. E a coisa julgada
significa exatamente isso: o resultado de uma ponderação levada a efeito
em um plano pré-processual entre, de um lado, a segurança jurídica e a
estabilidade das expectativas, e, de outro, a justiça e a isonomia.
3
2 Vale-se aqui do conceito de Crisanto Mandrioli:
“Ocorre, a questo punto, precisare che questa incontrovertibilità
è tradizionalmente designata come cosa giudicata, la quale può pertanto essere definita come la situazione in forza
della quale nessun giudice può pronunciarsi su quel diritto sul quale è già intervenuta una pronuncia che abbia esau-
rito la serie dei possibili riesami”
(
Corso di Diritto Processuale Civile. Nozioni Introduttive e disposizioni generali
. V.
1, 11ª ed., Torino: G. Giappichelli Editore, 2013, p. 14).
3 “
Per provvedere alla certeza della sfera giuridica dei litiganti, dando un valore fisso e costante alle prestazioni,
l`ordinamento giuridico vuole che l`attività giurisdizionale si spieghi un`unica volta (sebbene di solito colla possibilità
di più gradi): applicando la legge del minimo mezzo, esso mira al maximo risultado col minimo impiego d`attività; fra
i vantaggi della certezza giuridica e i danni dei possibili errori del giudice nel caso concreto dà la prevalenza ai primi”.
(CHIOVENDA, Giuseppe.
Principii di Diritto Processuale Civile
(3ª ed., 1923) ristampa inalterata. Napoli: Jovene
Editore, 1965, p. 911. No mesmo sentido, Nelson Nery Junior: “Entre o justo absoluto, utópico, e o justo possível,
realizável, o sistema constitucional brasileiro, a exemplo do que ocorre na maioria dos sistemas democráticos oci-
dentais, optou pelo segundo (justo possível), que é consubstanciado na segurança jurídica da coisa julgada material”
(
Princípios do processo na Constituição Federal
. 10ª Ed., São Paulo: Ed. RT, 2010, p. 52).