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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 113 - 132, abr. - jun. 2016
jogo e a definição do direito precedente em caso, sempre reconduzindo
ao sistema jurídico e à concordância prática
8
.
Na vertente da
teoria jurídica
, importa o reconhecimento da força
normativa da Constituição, com o rompimento da concepção da lei funda-
mental como um mero documento político que veicula convite à atuação
dos poderes públicos, mas a atribuição do
status
de norma jurídica delimi-
tando limites e impondo deveres de atuação para o Estado
9-10
.
Compreende, ainda, a posição de centralidade assumida pelos di-
reitos fundamentais no sistema jurídico, instituindo uma ordem objetiva
de valores e irradiando sua força normativa por todo o ordenamento, con-
dicionando a interpretação das normas e institutos dos ramos do Direito e
vinculando a atuação dos poderes públicos
11
.
Através do reconhecimento da supremacia axiológica da Constitui-
ção e do novo
status
dos direitos fundamentais na ordem jurídica, deriva
um processo de apreensão do sistema sob a ótica da Constituição com o
objetivo de realizar os bens e valores fundamentais veiculados, em um
processo designado de
constitucionalização do Direito
12
.
Corresponde o fenômeno, portanto, à transformação do ordena-
mento jurídico oriundo de sua impregnação pelas normas constitucionais,
que passam a redimensionar as atividades
legislativa
,
judicial
e
doutriná-
8 O emprego da técnica legislativa de conceitos jurídicos indeterminados dotados de maior plasticidade e textura
aberta e o reconhecimento de normatividade dos princípios com menor densidade jurídica inviabilizam que o intér-
prete extraia das normas em abstrato os elementos necessários a sua aplicação, sujeitando-se às suas valorações
e escolha entre as soluções possíveis, mediante a ponderação entre os bens envolvidos e argumentação como
elemento de controle da racionalidade da decisão proferida. Sobre o tema: REIS, Jane.
Interpretação Constitucional
e Direitos Fundamentais
. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. Em especial capítulo III.
9 Uma das obras percussoras sobre o tema é
A Força Normativa da Constituição,
de Konrad Hesse, extraída a partir
de sua aula inaugural na cátedra da Universidade de Freiburg. Segundo o autor, a norma constitucional não tem exis-
tência autônoma em face da realidade, mas tão pouco se limita ao reflexo das condições fáticas: sua essência reside
na pretensão de eficácia, de sua concretização na realidade imprimindo-lhe ordem e conformação. HESSE, Konrad.
A Força Normativa da Constituição
. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991, p. 14-15.
10 Na nossa experiência constitucional antes restrita a Constituições garantistas que tutelavam as liberdades for-
mais como repositórios de promessas vagas, significa a interrupção do ciclo inicial de baixa normatividade das dis-
posições que veiculavam os direitos fundamentais, em especial, das normas que declaravam os direitos sociais, com
o reconhecimento da aplicabilidade direta e imediata de seus preceitos. Sobre o tema: BARROSO, Luis Roberto.
O
Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas
: Limites e Possibilidades da Constituição Brasileira. 7 ed. Rio
de Janeiro, Renovar, 2003. Em especial Capítulo IV.
11 Apresentam os direitos fundamentais, portanto, uma dupla ordem de sentido: como vínculos axiológicos, que
condicionam a validade material das normas produzidas e enquanto fins que orientam o Estado Constitucional de
Direito. FERRAJOLI, Luigi.
Derechos e Garantias: La ley del mais débil
. 1 ed. Madrid: Trotta, 1999, p. 22.
12 A força irradiante da Constituição, portanto, não se limitou apenas à reconstrução dinâmica de seus próprios
enunciados de norma numa espécie previsível de autoalimentação constitutiva, mas se projetou para todo o sistema
jurídico, revisando o sistema de fontes e reestruturando seus pilares deontológicos. SAMPAIO, José Adércio Leite.
"Mito e História da Constituição: Prenúncios Sobre a Constitucionalização do Direito"
in
: SOUZA NETO, Cláudio Pe-
reira e SARMENTO, Daniel.
A Constitucionalização
... Ob. cit. p. 200.