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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 113 - 132, abr. - jun. 2016
garantias fundamentais, permitida sua excepcional restrição pelo interes-
se público desde que justificada a sua limitação
33
.
Inverte-se, desta maneira, na tensão promovida entre interesses
públicos e privados, a imposição do ônus argumentativo para os inte-
resses do grupo social que devem ser capazes de sobrepujar os direitos
individuais, no exame do caso concreto com o emprego do princípio da
proporcionalidade, em observância à centralidade assumida pelos direi-
tos fundamentais na ordem jurídica
34
.
Com este deslocamento do fundamento da dogmática adminis-
trativa da supremacia do interesse público para precedência dos direitos
fundamentais, as restrições e privilégios concedidos na realização das fi-
nalidades estatais alçam um novo fundamento de validade sob a ótica
ampliativa de uma Administração Pública garantidora.
Enquanto espécies de
potestad pública
concedidas aos agentes es-
tatais em razão das tarefas, que lhes incumbem realizar, as prerrogativas
administrativas não se aplicam igualmente em abstrato e com prevalência
absoluta, porém, na medida de sua necessidade à persecução do interes-
se público e desde que em equilíbrio com os direitos dos administrados
35
.
Sujeita sua incidência, deste modo, a ponderação com os demais
bens e valores conflitantes, tendo por foco a precedência natural dos
direitos fundamentais na ordem jurídica e o sólido sistema de garantias
projetado pela Constituição, que buscam compensar a sujeição do admi-
nistrativo às prerrogativas concedidas à Administração Pública
36
.
33 Havendo, portanto, colisão entre interesses públicos e privados, sendo os últimos direitos fundamentais, em
razão de sua precedência
prima facie
, apenas após um exame atento no caso concreto, fundado no princípio da
proporcionalidade e mediante a demonstração das razões que justifiquem sua sucumbência, prevalecerá o interesse
público sobre o privado. Caso o conflito refira-se a direitos distintos dos fundamentais, sujeita-se o procedimento a
mesma ponderação exceto que incorrendo em dúvida, prevalece a decisão adota pelo poder público. SARMENTO,
Daniel. "Interesses Públicos vs. Interesses Privados na Perspectiva da Teoria e da Filosofia Constitucional".
In
: SAR-
MENTO, Daniel (cood.).
Interesses Públicos..
. Ob. cit. p. 103 e 115.
34 A imposição de ônus argumento ao direito individual na sua tensão com os interesses do grupo social se demons-
tra incompatível com um Estado Constitucional de Direito marcado pela centralidade do homem e reconhecida a
fundamentalidade de seus direitos. Assim, no conflito devem existir maiores razões para a solução exigida pelos
bens coletivos do que para aquelas exigidas pelos direitos individuais. AVILA, Humberto. Ob. cit. p. 187.
35 As prerrogativas administrativas com predomínio da derrogação e da exorbitância do direito comum são de
origem francesa inexistindo no direito anglo-saxão, onde a Administração se sujeita às mesmas regras e armas
que os particulares para o cumprimento de suas tarefas. Inseridos na nossa ordem jurídica, esses privilégios têm
sido manejados, em especial, no campo processual, para reforçar a desigualdade na relação entre Administração e
Administrado inviabilizando a aplicação da lei. Sobre o tema: BUCCI, Maria Paula Dallari.
Direito Administrativo e
Políticas Públicas.
São Paulo: Saraiva, 2002, p. 118-135.
36 As garantias constitucionais formam um mecanismo que preservam a segurança jurídica do administrado e cons-
tituem, em sua essência, um poder geral abstrato e irrenunciável cujo exercício se torna um direito subjetivo ou