

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 73, p. 98 - 112, abr. - jun. 2016
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assim contrariavam algum valor juridicamente relevante – de tal modo
que a doutrina e, a seu turno, a jurisprudência optaram por buscar outra
fundamentação para a sua não produção de efeitos.
Diante de uma teoria das nulidades formalista, foi preciso buscar na
noção de inexistência o fundamento para negar eficácia a atos negativa-
mente apreciados pelo pensamento jurídico da época.
76
Este parece ser o
momento, porém, de repensar tal escolha, na medida em que uma leitura
funcional da teoria das nulidades responde de forma muito mais vanta-
josa às necessidades valorativas do intérprete, em lugar de uma figura
que, além de remeter muito mais a um juízo naturalístico do que jurídico,
foi originalmente concebida apenas para a superação da textualidade das
nulidades em setor muito específico do direito civil.
77
Com efeito, não se admite, particularmente na perspectiva civil-
-constitucional, que a ordem jurídica feche os olhos a qualquer ato huma-
no ou se abstenha de disciplinar as repercussões que ele pode ter provo-
cado mesmo antes que tenha havido tempo de se emitir qualquer juízo
sobre sua validade. Por tais razões, a inexistência resulta em categoria ar-
tificial, que pouco contribui à dogmática civilista, tendo em vista que, seja
do ponto de vista funcional, seja em seu perfil estrutural, não é possível
verificar distinção clara entre ela e a invalidade.
76 Em certa perspectiva, aliás, chega a ser contraditório que, para se evitar o recurso a uma espécie de nulidade
porque ela não era textual, tenha-se recorrido a uma categoria totalmente nova e que sequer era prevista na lei.
77 Nesse sentido parece postar-se Silvio RODRIGUES, ao afirmar que a inexistência poderia ser considerada inexata,
inútil e inconveniente: “Seria inexata porque, no mais das vezes, o ato malsinado cria uma aparência que para ser
destruída implica recurso judicial. [...] Seria inútil porque a noção de nulidade absoluta a substitui vantajosamente.
Se falta a um ato um elemento substancial, ele deve ser proclamado nulo e de tal declaração decorre sua total ine-
ficácia, gerando apenas aqueles efeitos porventura permitidos por lei. [...] Finalmente, seria inconveniente porque,
a ser verdade que se pode prescindir de ação judicial para declarar a inexistência, estar-se-á privando as partes,
interessadas no ato, das garantias de defesa que o processo oferece e dos eventuais efeitos por vezes atribuídos pela
lei, mesmo na hipótese de nulidade” (
Direito civil.
Volume I, cit., p. 291-292).