

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19,n. 73, p. 98 - 112, abr. - jun. 2016
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damente, do casamento celebrado entre duas pessoas do mesmo
sexo,
11
daquele contraído sem o consentimento de alguma das partes
e, ainda, do que não seguiu nenhuma forma legal.
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Não por acaso,
as primeiras discussões quanto aos negócios inexistentes surgiram no
âmbito do direito de família, seara mais diretamente influenciada por
questões morais, fortes o suficiente para suscitar questionamentos
sobre a teoria das nulidades.
A noção de inexistência solucionou o impasse: tais atos seriam
reputados como não ocorridos (
non avenus
), o que tornaria prescin-
dível que a ordem jurídica se pronunciasse sobre sua validade. A eles
se seguiram diversos outros exemplos criados pela doutrina, todos
controversos. Apenas na doutrina brasileira, são considerados inexis-
tentes por alguns autores: a declaração de última vontade gravada
em vídeo, e não registrada por escrito;
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o reconhecimento de pa-
ternidade de criança que nunca foi concebida
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ou de paternidade
absolutamente falsa;
15
o negócio dissimulado em simulação abso-
luta inocente;
16
o negócio realizado sob
vis absoluta
;
17
a declaração
de vontade jocosa ou didática, não dotada de seriedade;
18
a adoção
realizada verbalmente;
19
o testamento celebrado por procuração ou
mediante fraude, por quem se faça passar pelo testador;
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o contrato
11 Exemplo reproduzido por muito tempo na doutrina brasileira, mas superado nos dias de hoje, depois que o STF (ADIn.
4.277/DF e ADPF 123/RJ, Pleno, Rel. Min. Ayres Britto, julg. 5.5.2011; RE 477.554/MG, 2ª T., Rel. Min. Celso de Melo, julg.
16.8.2011) reconheceu as uniões homoafetivas como entidades familiares e o CNJ, em2013, aprovou resolução para obri-
gar os cartórios do país a habilitar e celebrar o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e a converter a união estável
homoafetiva em casamento (Resolução nº 175/2013, que proíbe as autoridades competentes a se recusarem a habilitar,
celebrar casamento civil ou de converter união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo).
12 Já existia, no entanto, no Código Civil francês a previsão de o casamento nulo prevalecer em benefício dos côn-
juges de boa-fé (art. 201), tendo-se adicionado, em 1993, a mesma previsão em benefício dos filhos (art. 202). No
direito brasileiro, admite-se a preservação de efeitos do casamento putativo desde o Código de 1916 (art. 221, que
chegou a sofrer uma mudança de redação para diferenciar casamentos nulos de anuláveis), dispondo o Código Civil
atual: “Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em
relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória. §1º Se um dos cônjuges
estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão. §2º Se ambos os
cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão”.
13 MELLO, Marcos Bernardes de.
Teoria do fato jurídico
: plano da existência, cit., p. 149.
14 VELOSO, Zeno.
Invalidade do negócio jurídico
: nulidade e anulabilidade, cit., p. 135.
15 LOPES, Miguel Maria de Serpa.
Curso de direito civil
. Volume I, cit., p. 505.
16 MELLO, Marcos Bernardes de.
Teoria do fato jurídico
: plano da existência, cit., p. 154.
17 LÔBO, Paulo.
Direito civil
: Parte Geral, cit., p. 283.
18 ASCENSÃO, José de Oliveira.
Direito civil
. Volume II, cit., p. 105-106.
19 VELOSO, Zeno.
Invalidade do negócio jurídico
: nulidade e anulabilidade, cit., p. 135.
20 MADALENO, Rolf. "Testamentos inválidos e ineficazes: revogação, rompimento, caducidade, anulabilidade e nu-
lidade".
In
: HIRONAKA, Giselda; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.).
Direito das sucessões e o novo Código Civil.
Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 265.