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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 27 - 40, jan. - mar. 2016

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sando o Direito e as Reformas Penais no Brasil: Violências contra a Mulher

e as Práticas Institucionais”, sob minha coordenação.

Desenvolvida no segundo semestre de 2013, tal pesquisa identifi-

cou problemas ainda sem solução. A incompatibilidade de expectativas

feministas e o arcabouço patriarcal de órgãos estatais, o atendimento ofe-

recido no cotidiano burocrático e as necessidades das assistidas quanto a

uma escuta sensível e humanizada, as respostas juridicamente engessa-

das no Judiciário e a esperança da “solução para a vida” das usuárias são

algumas questões pendentes.

Por não ser a violência de gênero em âmbito familiar e doméstico

um fato unicamente criminal, já que envolve relações pessoais e íntimas/

familiares, o conflito se mostra muito mais complexo e particular, não se

encaixando em padrões de decisão de escala industrial, formatados num

modelo de ritualística processual frio e cartesiano, nem se contentando

com as respostas penalistas que nossa legislação atual é capaz de fornecer.

Diga-se, aliás, que a Lei Maria da Penha é reconhecida como um

marco legislativo, sobressaindo, justamente, as medidas de caráter não

criminal, como a visibilidade trazida para as questões de gênero, inde-

pendentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura,

nível educacional, idade e religião; a ratificação do compromisso em tratar

a questão como violação a Direitos Humanos; as medidas integradas de

prevenção, que envolvem todos os níveis governamentais e não governa-

mentais; e as medidas protetivas de urgência.

Nesse sentido, percebeu-se a imprescindibilidade de uma lei que

pautasse o respeito, a proteção, a inclusão e o empoderamento da mulher

na comunidade, como indivíduo de igual nível intersubjetivo. Pode-se,

pois, dizer que a Lei Maria da Penha foi uma medida política emergencial,

a fim de uma mudança social pautada na legislação em busca de descons-

truir um antigo paradigma.

Uma lei que tenta contribuir para erradicar da realidade uma mar-

ca histórica de inferiorização do sexo feminino, de estigmas retrógrados

e discriminatórios. Uma lei, enfim, que defende a integridade física e

psíquica da mulher, a integridade social, a honra e a dignidade. Pretende

diluir da cultura o preconceito, a ideia de segregação e hierarquização

de gêneros, além de trazer para o âmbito criminal uma punição ao ator

desta violência tão singular e tão enraizada nas mentes da população

como “natural”.