

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 203 - 219, jan. - mar. 2016
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Como se pode perceber, para que se configure a violência domésti-
ca e familiar justificadora da qualificadora, faz-se imprescindível verificar
a razão da agressão (se baseada ou não no gênero).
A Lei Maria da Penha também traz o contexto em que a violência
doméstica e familiar baseada no gênero pode acontecer: âmbito da uni-
dade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto (art.
5º, I a III).
O tipo de violência vem especificado no art. 7º, o qual nomeia ex-
pressamente cinco tipos (física, moral, psicológica, sexual ou patrimonial),
deixando, porém, aberta a possibilidade de que sejam vislumbradas outras
espécies de violência (uma vez que se utiliza da expressão “dentre outras”).
Com essas informações, podemos concluir que se pode ter uma
violência ocorrida no âmbito doméstico que envolva, inclusive, uma rela-
ção familiar (violência do marido contra a mulher dentro do lar do casal,
por exemplo), mas que não configure uma violência doméstica e familiar
por razões da condição de sexo feminino (Ex. marido que mata a mulher
por questões vinculadas ao consumo de drogas). O componente neces-
sário para que se possa falar de feminicídio, portanto, como antes já se
ressaltou, é a existência de uma violência baseada no gênero (Ex.: marido
que mata a mulher pelo fato de ela pedir a separação).
Ainda levando em conta a interpretação sistemática, devemos fazer
referência ao art. 61, “f”, do Código Penal, que trata da agravante relativa
ao fato de o crime ter sido cometido “com violência contra a mulher na
forma da lei específica”, ou seja, da Lei Maria da Penha.
Vislumbramos, assim, um sistema no nosso ordenamento jurídico
que trata de criar normas penais gênero-específicas e é com base nesse
contexto que os dispositivos legais que estabelecem situações particula-
res para as vítimas do sexo feminino devem ser interpretados.
b) menosprezo à condição de mulher
A morte em razão de menosprezo à condição de mulher é a segun-
da espécie de feminicídio trazida pela nova Lei.
Há menosprezo quando o agente pratica o crime por nutrir pouca
ou nenhuma estima ou apreço pela mulher vítima, configurando, dentre
outros, desdém, desprezo, desapreciação, desvalorização.