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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 168 - 190, jan. - mar. 2016
Aqui não há privilégio nem discriminação de nenhuma diferença.
As diferenças são assumidas considerando-as como dotadas de diversos
valores e, por consequência, prescrevendo tratamento e respeito iguais.
Trata-se de um modelo que não ignora as diferenças, mas as reco-
nhece e as valoriza como sinal da identidade das pessoas, sobre a qual se
concretiza o senso autônomo de si mesmo nas relações com os outros. O
objetivo é a afirmação e a tutela da própria identidade, por força do mes-
mo valor associado a todas as diferenças que fazem de cada ser humano
um indivíduo diverso de todos os outros e de cada indivíduo uma pessoa
como todas as outras.
Porém, como recorda o autor, este igual direito é naturalmente
uma norma sujeita a violação. O que se destaca desse modelo é a sua ca-
pacidade de valorizar as diferenças de identidade, enquanto parte não da
proclamação abstrata de igualdade, mas sim do fato que essas diferenças
pesam nas relações sociais como fatores de desigualdade
e que devem
ser pensadas e elaboradas não só na formulação dos direitos, mas tam-
bém nas suas
garantias de efetividade.
Por tal motivo, não existe contradição entre diferença e igualdade.
Como afirma o autor, igualdade é um termo normativo que quer dizer que
os diferentes devem ser respeitados e tratados como iguais. Diferença,
por sua vez, é um termo descritivo, que indica que existem efetivamente
diferenças entre as pessoas, e que essas diferenças devem ser tuteladas e
respeitadas justamente para se cumprir o princípio da igualdade.
Por isso, posso concluir que não há sentido em contrapor a “igual-
dade” à “diferença” no caso do tratamento penal concedido ao feminicí-
dio ou à violência doméstica. Ao afirmarem os autores que os homens es-
tão sendo tratados de forma diferente das mulheres e que, portanto, são
"vítimas" de discriminação, estão justamente contrapondo a igualdade à
diferença e produzindo discriminação de gênero.
Além disso, reitero argumentos que já empreguei desde 2006,
quando vários autores alegaram a inconstitucionalidade da Lei Maria da
Penha, por violação do princípio da igualdade. Os dados estatísticos na-
cionais e de órgãos internacionais e regionais, indicam que as mulheres
são assassinadas no Brasil de forma sistemática, no âmbito das relações
privadas, em geral em seus lares e por companheiros ou ex-companhei-
ros. A constatação desse dado sociológico foi o fundamento empregado
pelo legislador quando optou por dar um tratamento jurídico específico
para essa situação.