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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 19, n. 72, p. 168 - 190, jan. - mar. 2016

para obter direito ao voto, para ter acesso a educação? Obviamente, devi-

do ao projeto de criação de um Estado moderno masculino.

Por consequência, a igualdade enquanto princípio jurídico é um

princípio excludente e não inclusivo

24

.

Retomo a Ferrajoli. Quero aqui destacar os comentários que este

tece sobre dois modelos de tratamento do princípio da igualdade na atu-

alidade

25

, posto que ocorreu mudanças no emprego e na teorização desse

princípio desde a Revolução Francesa. Usa o autor a expressão

homologa-

ção jurídica da diferença

para indicar ummodelo de política constitucional

em que as diferenças são desvalorizadas e negadas, não porque algumas

são concebidas como superiores, mas simplesmente porque as diferenças

são negadas em nome de uma abstrata afirmação de igualdade.

Eu diria que isso é o que nos propõe os juristas citados, quando

alegam que o tratamento legal dado ao feminicídio pelo legislador fere o

princípio da igualdade. Eles simplesmente optam por “suprimir” a dife-

rença de gênero, por anulá-la e (re) situá-la no âmbito da “invisibilidade”

social. As mulheres possuem os mesmos direitos que os homens enquan-

to

fingem

que são consideradas pela lei e pelas instituições jurídicas da

mesma forma que os homens. Este tipo de discurso serve para tutelar a

cultura patriarcal, porque parte do princípio que não existem diferenças.

Porém, existe um ulterior modelo que é de muito interesse nessa

análise. Trata-se do que ele denomina de

Igual valorização jurídica da dife-

rença

. Este se fundamenta no princípio normativo da igualdade em todos

os direitos fundamentais (políticos, civis e sociais) e, ao mesmo tempo,

está fundamentado sobre um sistema de garantias capazes de assegurar-

-lhe efetividade. Neste caso, a consideração da diferença é fundamental

para assegurar a igualdade.

Trata-se de um modelo muito interessante, porque não é indife-

rente verso a diferença, não abandona o indivíduo ao livre jogo da lei do

mais forte. Ao contrário, faz valer

a lei dos mais fracos

que são os direitos

fundamentais, conforme expressa Ferrajoli nos já mencionados textos

26

.

24 Apenas me permito citar mais um trecho do autor FILHO, já anteriormente citado, para demonstrar o que aqui

afirmo: “(...) Como se pode perceber, sob a ótica da nossa 

Carta Magna

, o princípio da igualdade vale para todos,

ou seja, não se é permitido fazer distinções em razão de sexo, raça, cor, profissão etc. O princípio constitucional da

igualdade (ou isonomia) deve ser entendido sob dois aspectos, quais sejam: igualdade no processo de criação de

uma lei, de forma a evitar que se criem privilégios a um determinado grupo ou classe de pessoas, e, ainda, tratamen-

to isonômico perante a lei, ou seja, a lei deve ser aplicada, igualmente, a todos(...).”

25 FERRAJOLI, Luigi.

Diritto e Ragione

,

op. cit

. p. 947 e ss.

26 Cf.nota 16. E

Diritot e Ragione

,

op. cit

, p. 947 e ss.