

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 71, p. 60 - 70, nov.- dez. 2015
69
Afirmamos assim, e com vistas às exposições de motivos dos proje-
tos
39
que deram origem à Lei 13.058 de 2014, que o inciso V do artigo 1.634
destina-se a tratar de mudanças próprias dos filhos crianças ou adolescen-
tes. De forma clara: os filhos crianças ou adolescentes só podem mudar de
domicílio com autorização dos pais, jamais podendo dizer quanto à autori-
zação para o cônjuge residir em outro domicílio em caráter definitivo.
Corrobora tal entendimento a nova redação do 1.584, também
alterada pela Lei 13.058, de 2014:
“§ 3º Na guarda compartilhada, a cidade considerada base de mo-
radia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos.”
Interpretando de forma sistemática tais dispositivos, vê-se com
clareza que não está (e nem poderia estar) vedada a alteração de resi-
dência (morada) dos filhos do casal, e, na disputa, será considerado o
melhor interesse dos menores.
Quid inde
? Como proceder diante da mudança de domicílio
anunciada pelo cônjuge com o qual os filhos do casal passaram a ter
morada, diante da guarda compartilhada ou unilateral?
Em primeiro lugar, é preciso reiterar que o dispositivo do inciso
V do artigo 1.634 do Código Civil não exige o consentimento do ex-
-cônjuge ou ex-convivente para a mudança de domicílio do outro que se
encontre com a custódia física dos filhos comuns ou com quem tenha
sido atribuído o domicílio dos filhos.
Considerando o imenso arcabouço fático que faz com que a re-
sidência dos filhos com a mãe seja na prática uma regra (a ser supera-
da), exigir autorização do pai para a mudança de domicílio implicaria
subjugar a mulher à vontade do homem.
Se o fizesse, incidiria em retumbante inconstitucionalidade, pela vio-
lação do artigo 5º, I c/c 226, § 5º da Constituição da República, e por viola-
ção do artigo 10 da Convenção Contra Todas as Formas de Discriminação da
Mulher de 1979, nos termos do artigo 5º, § 3º da Constituição da República.
Em segundo lugar, a questão deverá ser analisada pela teoria do
abuso do direito, prevista ainda que em delineamento que carece de
aperfeiçoamento, no artigo 188, I, do Código Civil, que manteve o ins-
tituto como “exercício irregular de uma faculdade jurídica”
40
, para am-
pliar seu alcance além do mero ato ilícito no artigo 187 do Código Civil.
39 Projeto de lei da Câmara n. 117/2013, n. 1.009/2011, na Casa de origem.
40 CARDOSO, Vladimir Mucury. “O Abuso do Direito na Perspectiva Civil-Constitucional”,
in
Princípios do Direito
Civil Contemporâneo
. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.