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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 71, p. 27 - 47, nov. - dez. 2015

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sem alma, que simplesmente pronunciavam as palavras da Lei:

Les juges

de la nation ne sont que la bouche qui prononce les paroles de la loi, des

êtres inanimés, qui n’en peuvent modérer ni la force ni la rigueur

.

Jean-Étienne-Marie Portalis (1746–1807) levou ao extremo a ideia

de que o Direito simplesmente decorria do texto legal, ao proclamar que

não ensinava o Direito Civil, mas o Código Civil francês de 1804, de cujas

letras pretendia extrair todos os comandos necessários à vida do cidadão.

Mas o texto legal é criatura humana, e por mais excelente que seja,

não se imuniza aos defeitos do seu criador, e não consegue prever todas

as situações que ocorrem na vida.

Impossível ao legislador regular para o futuro a multidão dos casos

que a dinâmica da vida impõe aos juízes resolver. Quase sempre os fatos der-

rotam a previsibilidade legal, por mais que esta seja ambiciosa ou arrogante.

Não há como substituir a função do Juiz tão somente pela letra fria

da Lei, que não pode tudo prever.

A função do Juiz é aplicar o Direito, efetivar no caso concreto o que

as leis preveem genericamente.

6. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA

Daí se evoluiu para o que se denominou de

interpretação sistemá-

tica

, mantida a desconfiança no papel do juiz, embora prosseguindo a re-

verência quase sagrada ao texto da lei.

A interpretação sistemática busca suprir as lacunas e leva o juiz e

os advogados a pesquisar no conjunto legislativo, nos diversos dispositi-

vos dos textos legislativos pertinentes, qual seria a vontade hipotética do

sistema da lei, a denominada

mens legis,

esta a significar a

inteligência da

lei

, ou o

espírito da lei,

os fundamentos práticos ou filosóficos que levaram

à edição do ato normativo.

O fundamento da interpretação sistemática é que há uma causa ou

razão ou fundamento para a existência da lei, a ideia geratriz que conduziu à

edição da lei, e que esta decorreria necessariamente de uma vontade única.

Assim é possível quando o diploma legal foi gerado por poucos

legisladores, o que não coaduna mais com o regime da democracia re-

presentativa, em que a vontade parlamentar decorre do consenso entre

centenas de representantes na Casa Legislativa.