

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 71, p. 159 - 186, nov. - dez. 2015
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O mais importante é que o intérprete esteja atento ao fato de que
a
boa-fé nas relações empresariais atua como elemento de controle da con-
duta dos agentes econômicos
, exigindo-lhes uma atuação leal e eficiente,
não se prestando, dessa forma, ao papel de mecanismo de neutralização
de possíveis “erros de cálculo” desses agentes
75
. As consequências do erro
na avaliação das circunstâncias do negócio constituem um risco que deve
ser suportado por aquele que errou, e não pela sua contraparte
76
. Assim,
no direito comercial,
torna-se especialmente importante que a boa-fé não
seja invocada como um meio de despir o agente econômico de sua sagaci-
dade peculiar
, autorizando comportamentos desconformes ao parâmetro
do mercado
77
.
6. CONTRAPONTO: O RISCO INVERTIDO DE INEFICÁCIA DA BOA-FÉ
A ideia apresentada de uma eficácia diferenciada no âmbito das
relações mercantis, especialmente em relação à mitigação dos deveres
anexos, não está blindada a críticas. Teresa Negreiros, após expor esta
temática, apresenta arguta observação, que merece ser reproduzida:
“A invocação generalizada e romântica da boa-fé – tentação
especialmente difundida em sistemas como o nosso, onde o
princípio da boa-fé foi forjado a partir da ideia de proteção
ao consumidor – é, no entanto, tão perigosa quanto o é a ten-
tação oposta. Ou seja: o argumento de que a boa-fé compor-
ta níveis diversos de intensidade corre o sério risco de tornar
o domínio das relações mercantis – cuja importância, tam-
bém simbólica, é central – num domínio imune, na prática,
às inovações trazidas pelo conceito de que os contratantes
(quaisquer contratantes) têm específicos deveres de lealdade
um para com o outro.
É justamente aí, no campo das relações mercantis, tão
sensível aos imperativos da globalização e da uniformização
75 Ibidem, p. 103-104. KLEIN, Vinícius; BITENCOURT, Thiago Wiggers. "Boa-Fé Objetiva"...,
op. cit.
, p. 23.
76 ROPO, Enzo.
O Contrato
. Coimbra: Almedina, 1988, p. 225
apud
LUPION, Ricardo.
Boa-Fé Objetiva.
..,
op. cit
.,
p. 168. De modo semelhante, Kleber Luiz Zanchim assenta: “os desequilíbrios devem ser preservados quando os
contratantes programaram o contrato para absorvê-los. É fato:
quem toma riscos deve suportar suas consequências
”
(grifo nosso) (ZANCHIM, Kleber Luiz.
Contratos Empresariais
,
op. cit
., p. 153).
77 FORGIONI, Paula A..
Teoria Geral
...,
op. cit
., p. 214.