Background Image
Previous Page  169 / 190 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 169 / 190 Next Page
Page Background

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 71, p. 159 - 186, nov. - dez. 2015

169

A função interpretativa da boa-fé objetiva impele o intérprete à

busca da compreensão das cláusulas contratuais que se revele mais ade-

quada ao objetivo comum perseguido pelas partes, e não aquela que se

mostre mais benéfica ao interesse privado exclusivo da contraparte. Essa

premissa se revela importante nas relações paritárias, particularmente

nas relações empresariais, nas quais o escopo bilateral de lucro muitas

vezes coloca o interesse individual dos contratantes em rota de colisão,

nas negociações em que a ampliação do retorno econômico de um im-

porte a redução do lucro do parceiro, inviabilizando a cooperação

48

. Já

em relação aos interesses comuns, objetivamente extraídos da avença,

a postura cooperativa se mostra plenamente exigível, com amparo na

cláusula geral de boa-fé.

Contribuindo para o esclarecimento da operatividade da boa-fé

não só de forma interpretativa, como também integrativa, o artigo 113

do Código Civil coliga a boa-fé aos usos do lugar da celebração do negó-

cio, entendidos aqui como os usos negociais do lugar da contratação

49

.

Contextualizado no campo mercantil, pode-se entender que o artigo faz

verdadeira remissão aos costumes da prática empresarial, ou seja, à boa

prática dos negócios

50

. Determinadas ações, surgidas espontaneamen-

te da praxe mercantil, destacam-se por sua aptidão para resolver pro-

blemas, sendo reiteradamente executadas pelos comerciantes e chan-

celadas pela jurisprudência. O repertório dessas práticas acaba sendo

memorizado pelos agentes econômicos, que passam a pautar suas con-

dutas com base nelas e a esperar, legitimamente, que as demais partes

também se comportem de acordo com esse modelo usual, o que amplia

a segurança nas transações

51

.

São essas “jogadas”, uniformemente praticadas e aceitas nas re-

lações mercantis, que devem servir de parâmetro na interpretação dos

negócios empresariais e na colmatação de eventuais lacunas

. Vale dizer:

a uma cláusula ambígua deve se conferir a interpretação conforme usu-

almente adotada pelos demais agentes econômicos na mesma situação,

48 TEPEDINO, Gustavo; SCHREIBER, Anderson. "A Boa-Fé Objetiva"...,

op. cit.

, p. 39.

49 MARTINS-COSTA, Judith. "Os Campos Normativos"...,

op. cit.

, p. 406-407."

50 MARTINS-COSTA, Judith. "O Exercício Jurídico Disfuncional"...,

op. cit.

, p. 57.

51 FORGIONI, Paula A..

Teoria Geral..

.,

op. cit.

, p. 116-118. KLEIN, Vinícius; BITENCOURT, Thiago Wiggers. "Boa-Fé

Objetiva"...,

op. cit.

, p. 22.