

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 71, p. 159 - 186, nov. - dez. 2015
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Primeiramente, deve-se tomar em conta que, a par da solidarie-
dade social, também a livre iniciativa tem foro constitucional
38
, de forma
que o artigo 170 da Lei Maior traduz, na dicção de Gustavo Tepedino, a
“
liberdade na solidariedade
”
39
.
Não há dúvida de que o ordenamento jurídico ainda tutela os inte-
resses individuais e patrimoniais dos sujeitos privados. A mudança para
qual se deve atentar é o fato de que as situações patrimoniais passam a
ser funcionalizadas às situações existenciais, uma vez que estas últimas
são expressões de valores centrais da ordem constitucional
40
.
Portanto, não se faz necessário negar a finalidade de lucro para
adequar a disciplina da empresa à Constituição
41
. Deve-se, sim, reconhe-
cer a sua função social, ou seja,
“o dever, imposto ao empresário, de observar, ao lado dos
interesses econômicos que o levam a desempenhar a ativida-
de, também interesses da coletividade, aí incluídos direitos
dos consumidores, da livre concorrência, do meio ambiente e
assim por diante. Nesse particular, importante destacar que
a função social da empresa atende, também, à tutela dos
interesses dos empregados e de suas famílias que dela de-
pendem para seu sustento, os quais deverão ser preservados
sempre que possível.”
42
É de se rejeitar a ideia de que a observância da função social se dá
através da prestação de serviços assistenciais ou em razão da expectativa
de lucro. No nosso ordenamento constitucional, a solidariedade não se
funda na potencialidade de retorno econômico ou em sentimentos altru-
ístas, mas constitui um verdadeiro dever de natureza jurídica
43
.
38 KLEIN, Vinícius; BITENCOURT, Thiago Wiggers. "Boa-Fé Objetiva"...,
op. cit.
, p. 17.
39 TEPEDINO, Gustavo. "Contratos Empresariais e Unidade do Ordenamento". Editorial da
Revista Trimestral de
Direito Civil.
Rio de Janeiro: Padma, v. 49, jan./mar. 2012, p. v.
40 PERLINGIERI, Pietro.
Perfis do Direito Civil
,
op. cit
., p. 32.
41 De modo semelhante: “É de se pontuar que a busca do lucro nos contratos empresariais em nada desmerece
essa importante atividade, exercida por empresas que criam empregos diretos e indiretos, fazem circular riqueza e
pagam impostos gerando os recursos financeiros necessários ao financiamento para que o Estado possa executar as
suas políticas públicas” (LUPION, Ricardo.
Boa-Fé Objetiva
...,
op. cit.
, p. 168).
42 TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; BODIN DE MORAES, Maria Celina.
Código Civil Interpretado
...,
v. III,
op. cit.
, p. 6.
43 BODIN DE MORAES, Maria Celina. "O Princípio da Solidariedade".
In:
Na Medida da Pessoa Humana
: estudos de
direito civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p. 244.