

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 70, p. 85-105, set. - out. 2015
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Note-se que tal decisão é perfeitamente válida com o Estado laico:
ele reconhece e coopera com as religiões, mas não as privilegia e não
pode excluir manifestações nesse âmbito de qualquer natureza.
Logo, e como sempre, quem professe essa religião tem o estatuto
do Tribunal Eclesiástico para se socorrer quando se tratar do fim do seu
casamento. E quanto aos católicos que não desejem o uso de tal expedien-
te ou todos os demais cidadãos que não professam essa fé ou fé alguma
recorrerão aos tribunais republicanos do país para promover o divórcio.
Um dogma não pode tutelar as leis da República, sob pena de sua
mais absoluta inconstitucionalidade, pela violação do princípio da separa-
ção entre Estado e religião
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.
Assim, e de forma clara, afirmamos que todas as disposições refe-
rentes ao instituto da “separação judicial” previstos no Código Civil de 2002
(anterior, portanto, à EC 66/2010) foram revogadas pela EC 66/2010, por-
que o instituto não faz mais parte do ordenamento jurídico vigente.
Afora raros precedentes
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admtindo a subsistência em nosso siste-
ma da separação logo após a EC 66/2010, a maioria das decisões dos Tri-
bunais observa firmemente a supressão do instituto da separação judicial.
Logo, para obter-se em uma corte republicana o divórcio, não há
exigência de consentimento do outro cônjuge
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, ou de prévia separação
ESPECÍFICAS DA LEI E COSTUMES DE PAÍS MUÇULMANO. SUBMISSÃO DA MULHER À VONTADE DO MARIDO QUANTO
AO DIVÓRCIO NO PERÍODO DO UDDAH. ATENDIDOS OS REQUISITOS DO ART. 217 DO RISTF. SENTENÇA HOMOLOGA-
DA.” (rectius: trata-se do instituto da Iddah, o “período de espera” da mulher muçulmana após a morte ou o divórcio,
durante o qual não pode se casar). A restrição atual no RISTJ é “Art. 216-F. Não será homologada a sentença estrangeira
que ofender a soberania nacional, a dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública.”
46 Constituição Federal: “Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer
cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus repre-
sentantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;”
47 TJRJ. A.C. n. 0049375-53.2011.8.19.0042 – APELAÇÃO. 1ª Ementa. DES. MARCOS ALCINO A TORRES - Julga-
mento: 13/08/2012 - DÉCIMA NONA CÂMARA CÍVEL. “SEPARAÇÃO CONSENSUAL. EMENDA CONSTITUCIONAL
Nº 66. REVOGAÇÃO DOS REQUISITOS DO DIVÓRCIO. COMPATIBILIDADE COM O ORDENAMENTO INFRACONSTI-
TUCIONAL. Com a nova redação do artigo 226 da Constituição Federal promovida pela Emenda Constitucional
nº 66/2010, houve a supressão dos requisitos para o divórcio, que pode ser atingido sem qualquer condição ou
requisito, sendo contudo, prematuro, em que pese as diversas opiniões em contrario, sem alteração dos disposi-
tivos pertinentes do CC/02, afirmar que fora extinta separação de modo consensual, uma vez que pode não ser
interesse do casal extinguir o vínculo, mas simplesmente estabelecer regras para um tempo de reflexão, cujo ápi-
ce pode ser o divórcio ou a reconciliação, decisão que lhes cabe no futuro tomar. Recurso a que se dá provimento,
na forma do artigo 557, caput, do CPC.”
48 TJRJ, A.C. n. 0153771-73.2012.8.19.0001 – APELACAO. DES. AGOSTINHO TEIXEIRA DE ALMEIDA FILHO - Julgamen-
to: 12/08/2013 - DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL. “Y ajuizou ação de divórcio contra X. A ré ofereceu contestação
e reconvenção, alegando que existe um automóvel a ser partilhado e que deseja manter o nome de casada (fls.