

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 70, p. 85-105, set. - out. 2015
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lulas tronco embrionárias na ADI 3.510/DF e no julgamento conjunto da
ADI n. 4.277-DF e da ADPF n. 132-RJ em 05/05/2.011, que entendeu como
entidade familiar aquela formada por qualquer dos cônjuges e inclusive
por pessoas do mesmo sexo.
Mas o laicismo não se confunde com o Estado antirreligioso
34
.
Nesse passo, o governo brasileiro entendeu haver possibilidade de
colaboração de interesse público (art. 19, I, CF), e editou na ordem interna
o Acordo Brasil-Santa Sé
35
, o qual é em parte objeto de questionamento
de constitucionalidade pela ADI n. 4.439, em razão do teor do artigo 11,
§ 1º, que estabelece o ensino religioso e confessional, partindo do pres-
suposto de que a norma em questão violaria visões não religiosas ou de
outras religiões “com menor poder na esfera sócio-política”
36
.
A discussão ali é exatamente sobre a separação entre o Estado e
qualquer religião
37
. O que se busca com tal princípio é a neutralidade do
Estado ante qualquer religião. Somente se pode assegurar a liberdade de
crença e o livre exercício dos cultos religiosos (art. 5º, VI, CF) se o espaço
comum não consagrar nenhuma delas e cooperar com todas as possibili-
dades de manifestação nesse campo.
cional interpretação de a interrupção da gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e
128, incisos I e II, do Código Penal.”
34 Que adota posição de neutralidade ante a religião. Diverso do Estado hiperlaico ou antirreligioso, que combate a
religião ou prega a ausência de religião. Sobre o debate a respeito do “véu islâmico” nas escolas públicas francesas:
“La laïcité face au communautarisme et à l’ultra-laïcisme”, Catherine Kintzler, disponível em
http://www.mezetulle.net/article-13078343.html (acesso em 10/08/2015 às 23h43). Não é saudável em termos de República o uso do
“véu” em um espaço público ‘escola’, local de divulgação do conhecimento e não do exercício religioso. A expressão
máxima do laicismo é respeitar até mesmo o imaginário dos demais concidadãos e não os afrontar com manifes-
tações privadas de crença. Mas os indivíduos podem ostentar seus símbolos religiosos como manifestação de sua
liberdade civil do direito à livre manifestação do pensamento, ao livre exercício da crença e à intangibilidade cor-
poral. Diferente será utilizar o espaço público para cultos, interromper as aulas com a mesma finalidade,
et cetera.
35 Decreto 7.107/2010.
36 Fls. 03 da petição inicial da PGR, disponível em
http://noticias.pgr.mpf.mp.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_pdfs/ADI%204439.pdf. Acesso em 04/08/2015 às 10h27.
37 A Primeira Emenda à Constituição norte-americana não só assegura o direito de todo cidadão de escolher livre-
mente a sua religião, como impede que o Estado reconheça ou favoreça qualquer religião, exatamente como faz
nossa Constituição no seu artigo 19, I. Thomas Jefferson falava da “muralha” da separação entre Estado e religião
(janeiro de 1802, Discurso na Associação Batista de Danbury, Connecticut), a respeito da 1ª Emenda à Constituição
Norte-americana, “Creyendo con ustedes que la religión es un asunto que ha de quedar exclusivamente entre le
hombre y Dios, y que ele hombre no deve dar cuentas a ningún otro por su fe o culto, y que los poderes legislativos
del gobierno alcanzan solo a las acciones y no a las opiniones, contemplo con soberana reverencia ese acto de todo
el pueblo americano que declaró que su legislatura no debía ‘ny promulgar leyes con respecto al establecimiento de
la religión ni prohibir el libre ejercicio de ella, construyendo así un muro de separación entre la Iglesia y el Estado.”
(
in
Antología Laica: 66 textos comentados para comprender el laicismo
, por Henri y Peña-Ruiz, César César Tejedor
de la Iglesia, p. 225). Veja-se a esse repeito o case, no voto do Supreme Court Justice
Harry A. Blackmun in the Lee
v.
Weisman ruling
, 1992: “When the government puts its imprimatur on a particular religion it conveys a message of
exclusion to all those who do not adhere to the favored beliefs. A government cannot be premised on the belief that
all persons are created equal when it asserts that God prefers some.”