

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18,n. 69, p. 115-128, jun. - ago. 2015
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circunstâncias pessoais possuem o condão de dilatar ou reduzir – mas ja-
mais eliminar – o âmbito de proteção cabível a cada indivíduo
21
. Como será
mais bem discutido na parte final deste artigo, nos parece até mesmo, que
as diferentes classes de pessoas famosas atraem níveis de tutela distintos.
Embora seja lícito que pessoas notórias renunciem à proteção de
sua vida privada – expondo voluntariamente, como é corriqueiro, deta-
lhes sobre seus estados de saúde e suas vidas amorosas –, a fama não
implica uma renúncia irrestrita e permanente à intimidade. Dito de outro
modo, no que toca a assuntos privados e desafetos à causa de notorie-
dade da pessoa famosa, e em face da inexistência de qualquer interesse
público legítimo apto a autorizar sua divulgação, não há de se falar em
“um pretenso ‘direito fundamental da sociedade’ a conhecer as fofocas
e os detalhes picantes”
22
da vida de celebridades e autoridades públicas.
Um exemplo ilustra o ponto. Suponhamos que, a partir de aprofun-
dados estudos e investigações, um biógrafo descubra que determinado
ex-presidente do Brasil manteve, secretamente, dezenas de casos extra-
conjugais. Aprioristicamente, não haveria fundamento jurídico que auto-
rizasse a publicação de tais episódios – uma vez que as relações amorosas
e sexuais não abertas volitivamente ao conhecimento público, em regra,
inscrevem-se em uma zona de intimidade inviolável. Entretanto, imagine-
-se que duas das amantes deste antigo presidente tivessem, em algum
momento, sido indicadas para compor o Supremo Tribunal Federal. Nesta
hipótese, emerge nítido direito coletivo de acesso a tal informação, o que,
ao nosso ver, respaldará qualquer eventual divulgação de tais fatos.
No que toca à tutela preventiva do direito à vida privada, o autor da
ADIn 4.815 sustenta que:
"41. Um julgamento caso a caso, em relação às informações
suscetíveis ou não de serem reportadas, representaria, cer-
tamente, a extinção do gênero das biografias não autoriza-
21 “A questão, na realidade não se resolve a partir da lógica do tudo ou nada. Como acontece com frequência com os
direitos fundamentais, é a lógica da ponderação que acabará por reduzir – mas não eliminar – o âmbito de proteção
da intimidade e da vida privada nesses casos”. BARCELLOS, Ana Paula de. "Intimidade e Pessoas Notórias, Liberda-
des de Expressão e de Informação e Biografias, Conflito entre Direitos Fundamentais. Ponderação, Caso Concreto e
Acesso à Justiça. Tutela Específica e Indenizatória".
Direito Público
, v. 55, jan/fev 2014, p. 54.
22 BODIN de MORAES, Maria Celina.
Biografias não autorizadas:
conflito entre a liberdade de expressão e a pri-
vacidade das pessoas humanas?. Rio de Janeiro: Civilistica, 2013 (Editorial). Disponível em:
<http://civilistica.com/biografias-nao-autorizadas>. Acesso em: 18/01/2014.