

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18,n. 69, p. 115-128, jun. - ago. 2015
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esfera de inviolabilidade da vida privada de pessoas notórias seria resultado
de uma escolha feita por elas, o que, como rapidamente se demonstrou,
não é verdade para todas as pessoas famosas. Não obstante a tais diferen-
ciações, reitera-se que a fama - de qualquer espécie e intensidade -, em
nosso entender, não implica a ablação total da privacidade do seu portador.
Por fim, deve-se analisar a relação de pertinência entre a causa de
fama e o fato que se pretende divulgar, sindicando ainda, como já adian-
tado, se existe ou não algum interesse público que legitime tal divulgação.
Imaginemos, para melhor entender a afirmação, que a biografia de uma
parlamentar famosa por liderar campanhas contra a descriminalização
das drogas revelasse que a mesma, quando jovem, era usuária de maco-
nha. Teríamos uma situação semelhante na hipótese de se descobrir que
um importante pastor fundamentalista, célebre por se opor aos direitos
da população LGBT, manteve, secretamente, uma relação homossexual.
De modo diverso, os mesmos episódios não poderiam ser divulgados sem
autorização em se tratando de pessoas notórias em geral.
Para encerrar este artigo, ainda cabe uma consideração, seguida
por uma proposição. O acesso prévio às biografias, por parte do biografa-
do ou seus familiares, é pressuposto para impedir que as ofensas aos seus
direitos da personalidade se concretizem. Depois de publicadas, resta
apenas a indenização monetária – o direito constitucionalmente tutelado
não mais se recupera. Neste sentido, ainda que se vislumbre a possibilida-
de de se obter acesso prévio ao conteúdo de obras biográficas por meio
de ações judiciais cautelares, seria interessante estatuir em lei a obrigação
de o biógrafo remeter ao biografado uma versão prévia da obra que pre-
tende publicar, pouco antes de fazê-lo. De modo algum, a sugestão refe-
rida confunde-se com a concessão ao biografado da prerrogativa de vetar
a publicação de obras a seu respeito, trata-se apenas de oportunizar que
ele efetivamente possa tutelar sua intimidade, imagem e honra. Este, sem
embargo, é um ponto que, ao menos, merece ser considerado e discutido
pela sociedade e pelas instituições legiferantes competentes.
Nota do Autor:
O presente artigo foi redigido e submetido à análise editorial antes da sessão de julgamento da
ADIn 4.815, que ocorreu em 10.06.2015. Nessa oportunidade, o plenário do STF deu provimento à referida ação,
para declarar inexigível o consentimento do biografado para a publicação e divulgação de obras biográficas. Na
mesma ocasião, os Ministros entenderam, a meu sentir de modo equivocado, que as transgressões aos direitos da
personalidade, constantes de biografias, devem ser reparadas basicamente mediante indenização pecuniária poste-
rior - vedando-se, deste modo, a tutela inibitória da imagem, da honra e da intimidade. Com essa decisão, longe de
encerrado, o debate ora apresentado ganha em relevância e atualidade.