

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 68, p. 126-152, mar. - mai. 2015
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Além disso, é inegável que, hoje, as relações de afeto se sobre-
põem ao vínculo biológico, sendo certo que “negar a possibilidade
do reconhecimento da filiação quando os pais são do mesmo sexo
é a forma mais cruel de discriminar e de punir”.
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Assim, defender a
impossibilidade de adoção por casais homoafetivos seria explicitar
a discriminação e o preconceito voltados para a sexualidade.
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Ademais, o artigo 227 da Constituição Federal e o artigo 4º do
Estatuto trazem a previsão do Direito à Convivência Familiar e Comu-
nitária da criança e do adolescente, de modo que estes devem ter ga-
rantido o direito de crescerem no seio de uma família, na qual possam
desenvolver laços sociais, de carinho, respeito, atenção e proteção.
Dessa forma, indeferir o pedido de adoção por um casal homo-
afetivo que pretende cuidar daquela pessoa em condição peculiar de
desenvolvimento, preferindo a sua institucionalização com base em
preconceitos de ordemmoral ou religiosa, é violar este direito consti-
tucional, na medida emque restringe as possibilidades daquela crian-
ça ou daquele adolescente de ser inserido em um contexto familiar.
No julgamento do Recurso Especial nº 889.852 - RS
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, de relatoria
do Ministro Luís Felipe Salomão, a 4ª Turma do STJ, de forma expressa
e unânime, decidiu favoravelmente à adoção de duas crianças por um
casal homoafetivo.
No caso analisado pelo Tribunal Superior, a companheira da postulan-
te havia adotado judicialmente as duas crianças, irmãos biológicos, desde o
nascimento. Como o par já vivia em união homoafetiva havia aproximada-
mente 12 anos, tendo a postulante estabelecido laços de afetividade com
os filhos da parceira, ajuizou pedido de adoção, que foi julgado procedente
no juízo de 1º grau, após a realização de estudo social do caso. A sentença
determinou, ainda, a inserção do sobrenome da postulante no registro das
crianças, “sem mencionar as palavras pai e mãe” e acrescentando que “a
relação avoenga não explicitará a condição materna ou paterna”.
O Ilustre Relator do caso, Ministro Luís Felipe Salomão, atentou,
primeiramente, à necessidade de se sincronizar a interpretação legal ao
tempo presente. Assim, tendo em vista a velocidade das transformações
21 DIAS, Maria Berenice.
Manual de direito das famílias
. 8. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 499.
22 FARIAS; Rosenvald,
op. cit.
, p. 1071.
23 STJ, 4ª Turma, REsp nº 889.852 – RS, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, Julg.: 27/04/2010, DJe: 10/08/2010.