

R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 550 - 569, jan - fev. 2015
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Uma arquitetura em harmonia com o papel jogado pelo juiz de-
manda a reestruturação dos procedimentos penais, que viabilize o exercí-
cio da função de garante da presunção de inocência.
Não custa lembrar, por exemplo, que “a instrução [preliminar], como
etapa pré-processual que cumpre, aomesmo tempo, coma função de forma-
ção de provas fora do contraditório, é o eixo de um processo inquisitivo”
36
.
Em outra oportunidade destaquei que as experiências históricas
que podem servir de paradigma ao processo penal brasileiro, quanto à
estrutura acusatória, distinguem as atividades de persecução penal em
três grandes etapas: fase preliminar, fase preparatória e fase de juízo
37
.
A fuga da armadilha criada pelo processo bifásico (e da mentalida-
de inquisitória) reclama, conforme destaca Franco Cordero, a superação
da herança pós-inquisitória, por meio do alheamento do modelo de duas
etapas – ou misto – na direção daquele que exige da acusação hipóteses
acusatórias bastante prováveis de resistir ao debate oral e ultrapassar a
presunção de inocência
38
.
Por outro lado, a delicada harmonia entre o estatuto jurídico das
principais personagens do processo e a estrutura processual requisita da
doutrina que coloque em perspectiva a constante pressão por fortalecer
os poderes repressivos em detrimento de garantias asseguradas na Cons-
tituição e nos tratados internacionais sobre direitos humanos.
O que ocorre na Europa, na atualidade, pode dar uma boa medida
da delicada relação entre poderes processuais e direitos fundamentais,
poderes que são exercitados também pelo Ministério Público.
Com efeito, assevera Bernd Schünemann que a transformação das
formas de criminalidade, principalmente nos últimos vinte e cinco anos,
na Alemanha, tem gerado reações difíceis de desenredar, que colocam
em relevo um tipo de processo penal caracterizado pelo fortalecimento
das posições processuais de poder das autoridades de prevenção, como
referido, ao custo das posições do investigado e da defesa
39
.
Uma acumulação de poderes ou forças processuais (
Gewalten-
häufung
)
40
dessa ordem, em um procedimento carente de publicidade,
36
Las garantías del procedimiento en la experiencia italiana,
obra citada, p. 185.
37 Com referência ao tema: PEÑARANDA L PEZ, Antonio.
El proceso penal en España, Francia, Inglaterra y Estados
Unidos:
descripción y terminología.
Granada, Comares, 2011, p. 37-42.
38 CORDERO, Franco.
Procedimiento Penal
, v. II, Bogotá, Temis, 2000, p. 141.
39 SCHÜNEMANN, Bernd.
La reforma del processo penal
, obra citada, p. 43.
40 SCHÜNEMANN, Bernd.
Audiência de instrução e julgamento
: modelo inquisitorial ou adversarial? Obra citada, p. 634.