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R. EMERJ, Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 550- 569, jan - fev. 2015

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exercício da defesa, até mesmo por falta de defensor, e no qual a prova ilí-

cita constituía referência hipotética, quase nunca reconhecida, ao menos

se os processos envolvessem pessoas de carne e osso.

Típico deste estado de coisas, o regime de ônus da prova, sustenta-

do em teoria com base nas regras de um Código que é reconhecido como

inquisitorial, foi invocado no âmbito do Supremo Tribunal Federal, duran-

te o julgamento do denominado caso do “Mensalão”.

24

O debate teórico travado nos últimos anos, no Brasil, de maneira di-

reta ou não, foi pautado pela linguagem desenvolvida no marco da teoria

unitária do processo e ressentiu-se disso.

4. O amadurecimento do debate teórico no campo jurídico

penal no Brasil: a releitura das categorias do processo

O diálogo entre direito e poder na seara da justiça criminal, pelo

prisma da dogmática processual penal, ainda é recente e merece registro

que haja resultado da interlocução com a criminologia crítica, especial-

mente a partir dos anos 90. Vale sublinhar que este processo de permea-

bilidade dos saberes criminológico e processual, sob o ângulo da forma-

ção acadêmica, teve lugar na “periferia” da tradicional escola de processo

de São Paulo

25-26

.

Segundo posição defendida nesta comunicação, apenas a ruptura

com o discurso de um idealizado processo penal acusatório, incapaz de

resistir a minutos de embate com a realidade, logrou aproximar o pen-

samento processual penal brasileiro das graves questões que ocupam a

dogmática processual penal contemporânea.

24 O cerne da ideia foi desenvolvido por Hélio Tornaghi, com fundamento em um processo em que as partes encontra-

vam-se em posição de igualdade, excluída a eficácia da presunção de inocência para demarcar o campo de incidência de

poderes probatórios. TORNAGHI, Hélio.

Instituições de Processo Penal.

Volume IV. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 231.

25 Releva notar que parte da doutrina fez a sua “opção preferencial” pelo processo penal constitucional, mas a

“leitura constitucional” deste novo paradigma padecia do vício do formalismo exegético, incapaz de localizar os

fenômenos políticos no âmago das questões jurídicas. Isso explica a afirmação de respeitada processualista que, em

ensaio de 1984, declarou: “Detendo a primazia de ter constitucionalmente subjetivado e positivado os direitos do

homem, o Brasil tem-se mantido fiel à tradição de reconhecer e garantir as posições processuais das partes, assegu-

rando-lhes as condições necessárias para a instauração e o desenvolvimento de um processo justo” (“As garantias

constitucionais do processo” [subitem 9. Constituição e Processo],

in

Novas Tendências do Direito Processual Penal

de acordo com a Constituição de 1988.

GRINOVER, Ada Pellegrini. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1989, p.

13). No mesmo sentido: GRINOVER, Ada P. “Teoria Geral do Processo”

in

O processo em evolução

. 2ª ed. Rio de

Janeiro, Forense Universitária, 1998, p. 6-7. A considerar o fato de que ao tempo desta comunicação (2013) o Estado

de Santa Catarina não cumpriu decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), no sentido de instalar efetivamente a

Defensoria Pública, e esta não existe em concreto no Paraná e em Goiás, compreende-se o valor atribuído pelos

juristas à retórica constitucional-legal em detrimento da realidade.

26 Sobre a Escola Processual de São Paulo: GRINOVER, Ada P. “Teoria Geral do Processo”

in

:

O processo em evolu-

ção...

, obra citada, p. 5.